Coragem é o que se exige, para gritar a plenos pulmões, e ir para as ruas mais uma vez
Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, morreu no dia 2 de maio de 1997, há 34 anos.
Nas palavras de Paulo Freire, “se alguém, ao ler este texto, me perguntar, com irônico sorriso, se acho que, para mudar o Brasil, basta que nos entreguemos ao cansaço de constantemente afirmar que mudar é possível e que os seres humanos não são puros espectadores, mas atores também da história, direi que não. Mas direi que mudar implica saber que fazê-lo é possível” (Segunda Carta, do Direito e do Dever de mudar o Mundo, Paulo Freire, Pedagogia da Indignação, Paz e Terra, 7 de abril de 1997, p. 61, a menos de um mês de seu falecimento).
Paulo Freire foi preso em 1964, logo depois do golpe militar, depois de lançar, em 1963, o Plano Nacional de Alfabetização, que iria oferecer letras e palavras e sentido do mundo a 5 milhões de brasileiras e brasileiros e criar 20 mil Círculos de Cultura. Os anos 1960 estavam sendo tempos de construção da democracia. Acabaram tempos de destruição da liberdade e da democracia, com o golpe militar de 31 de março de 1964.
Em ‘Denúncia, Anúncio, Profecia, Utopia e Sonho’ (Pedagogia da Indignação, dezembro de 1996, p. 142), Paulo Freire fala da “negação atual do sonho e da utopia e da briga por eles, agora e no começo do século que vem”. “Enquanto presença na História e no mundo, esperançadamente luto pelo sonho, pela utopia, pela esperança, na perspectiva de uma Pedagogia crítica. E esta não é uma luta vã” (Educação e Esperança, Pedagogia da Indignação, p. 134, 09.12.1996).
Na semana de 17 a 21 de maio de 2021, dentro da Campanha Latino-americana e Caribenha em Defesa do Legado de Paulo Freire, sob coordenação do CEAAL (Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe), movimentos populares, ONGs, Universidades, Pastorais Sociais estão promovendo a Semana de Mobilização pelo Direito à Vida: Trabalho, Pão, Vacina, Educação: anúncio/denúncia em reflexão e defesa da luta da classe trabalhadora. Assim, o centenário de Paulo Freire está colado ao tempo vivido, à realidade e à conjuntura de 2021, como sempre a pedagogia libertadora freireana se construiu e aconteceu desde os anos 1950, primeiro no Brasil, depois espraiando-se pelo mundo.
Em tempos de neoliberalismo e destruição do Estado, nos anos 1990 e início dos anos 2000, Paulo Freire escreveu, à mão, como era seu hábito, as Cartas da Pedagogia da Indignação, em meio às Marchas do MST pelas ruas de Brasília e de todo país, das lutas por consolidação dos direitos da Constituição Cidadã, dos governos populares com a construção da Escola Pública, Popular e Democrática, do Orçamento Participativo e do Fórum Social Mundial, ‘um outro mundo possível’.
Indignação é o de que se precisa hoje, 2021, mais que nunca. Pedagogia da Indignação para juntar clamores, angústias, sofrimento, nas vozes de milhares/milhões.
Coragem é o que se exige, para gritar a plenos pulmões, e ir para as ruas mais uma vez, mobilizar quem quer a verdade, quem quer justiça, igualdade, soberania, democracia. Na base popular, mais que hora de reinventar Paulo Freire, no meio do povo e das periferias, de trabalhadoras e trabalhadores.
Esperança, esperançar. Paulo Freire, obrigado a sair do Brasil em 1964, foi acolhido no Chile, onde escreveu Educação como Prática da Liberdade e a Pedagogia do Oprimido. Mauri Cruz, educador popular, Diretor da ABONG (Associação Brasileira de Organizações Governamentais), membro do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial e do CAMP (Centro de Assessoria Multiprofissional), escreveu em ‘Os Ensinamentos do Povo chileno’, depois da eleição dos constituintes chilenos que vão redigir uma nova Constituição, substituindo a da ditadura de Pinochet : “É este espírito revolucionário que reacendeu a esperança no Chile e que precisamos transcender em nossos corações e mentes no Brasil e no resto do mundo.”
“Quando Paulo viu aquela multidão entrando, altiva e disciplinadamente, na Esplanada dos Ministérios, ficou de pé caminhando de um lado para outro da sala, com os pelos do corpo eriçados, poros abertos e suor quente. Repetia com voz emocionada, falando para os Sem Terra e não para mim estas palavras carregadas da sua compreensão perante o mundo: ‘É isso minha gente, gente do povo, gente brasileira. Esse Brasil é de todos e todas nós. Vamos em frente, na luta sem violência, na resistência consciente, com determinação tomá-lo para construirmos, solidariamente, o país de todos e de todas os/as que aqui nasceram ou a ele se juntaram para engrandecê-lo. Esse país não pode continuar sendo o de poucos... Lutemos pela democratização desse país. Marchem, gente de nosso país...’.” (Nita, Ana Maria Araújo, Freire, em Pedagogia da Indignação, p. 73, citando as palavras de Paulo Freire sobre a Marcha do MST em Brasília em 17.04.1997). Lembrando: Paulo Freire morreu no dia 02 de maio de 1997, duas semanas depois da Marcha.
Em 19 de setembro de 2021, Paulo Freire completará 100 anos, em tempos tão ou mesmo mais difíceis que os anos 1960/70 e os anos 1990. As Marchas devem voltar e acontecer com mais força em 2021, assim como a resistência ativa à ditadura neofascista e necrófila reinante. Vacina no prato, comida no prato! Ninguém solta a mão de ninguém!
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko