O Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de Porto Alegre (Cejusc-POA) realizou na tarde desta quarta-feira, 5, a segunda sessão de conciliação nos processos judiciais contrários ao retorno das aulas presenciais no estado.
As atividades letivas suspensas pelo judiciário na bandeira preta foram retomadas na última segunda-feira, 3, depois que o governo do estado alterou a cor da bandeira, colocando todo o RS em bandeira vermelha no sistema de distanciamento controlado.
Com a mudança da cor da bandeira, a 1ª Vara da Fazenda Pública indeferiu pela manhã os requerimentos para suspensão da presencialidade, já que houve um deslocamento no objeto das ações: a cor da bandeira.
A juíza Cristina Luísa Marquesan da Silva entendeu que não poderia julgar a legalidade do decreto, que segue sendo questionada pelas entidades autoras das ações – Fetee-Sul, Sinpro/RS, Cpers-Sindicato e Associação de Mães e Pais pela Democracia (AMPD).
Nova ação do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa) está em julgamento na 1ª Vara, que fixou prazo de três dias para uma manifestação da prefeitura da capital antes de julgar a legalidade do decreto.
Na semana passada, o conjunto das ações judiciais das entidades foi encaminhado para o órgão de conciliação com vistas a um acordo. A primeira sessão foi realizada na segunda-feira.
Impossibilidade e temeridade
Na audiência do Sejusc desta quarta-feira, cientistas e especialistas convidados pelas entidades foram enfáticos a respeito da “impossibilidade e da temeridade” da volta às aulas neste momento.
Também se manifestaram técnicos convidados pelos governos municipal e estadual e pelo Sinepe/RS, favoráveis às aulas presenciais.
As posições serão sistematizadas por um grupo de trabalho no processo de mediação. A próxima audiência foi agendada para o dia 14, às 9h.
“Não há até agora decisão sobre a legalidade do decreto do governador e nós continuamos sustentando que ele é ilegal”, ressaltou o advogado Júlio Sá, representante da Associação de Mães e Pais pela Democracia (AMPD).
A sessão foi presidida pela juíza Dulce Ana Oppitz, coordenadora do Cejusc de Porto Alegre.
Carga viral em movimento
Armando de Negri, médico na área de políticas públicas de saúde, gestão clínica e medicina de emergência foi o primeiro técnico a se manifestar.
“A pandemia nos obrigou a um aprendizado contínuo. Vimos o que ocorreu no mundo para prever o que ocorreria aqui e como governos e sociedade civil se organizaram para diminuir os danos dessa patologia. Sobre a natureza dessa doença sabemos pouco. O descontrole da disseminação do vírus faz com que ele fique variando. O vírus é uma estrutura que aprende. Hoje, as variantes dominantes aprenderam a driblar a imunidade e se instalar no organismo e podem colocar à prova a capacidade das vacinas existentes”, explicou.
Negri, que atua na rede brasileira de cooperação na área de emergências, é pesquisador convidado da Fiocruz e participa de espaços internacionais vinculados à sociedade civil, lembrou que as informações à disposição da comunidade científica não são suficientes para prevenção definitiva. “O distanciamento, o uso de máscara e o fechamento de atividades não essenciais deveriam ser observados rigorosamente até a efetiva vacinação da população. Não trocamos o distanciamento pela vacinação. Precisam caminhar juntos. As crianças são vetores que movimentam o vírus e concentram cargas virais, mesmo não tendo casos clínicos exuberantes, e facili
tam o contágio de outras pessoas, no caso, adultos mais suscetíveis a desenvolver a doença”, alertou.
Modelo sem credibilidade
“As crianças não serão vacinadas tão cedo. Também não podemos passar todo ano de 2021 sem aulas presenciais. A questão é se é hoje, se é em algumas semanas ou meses. Precisamos de protocolos seguros e vejo evolução nesse ponto, mesmo vendo as dificuldades estruturais das escolas. Mas, o modelo de distanciamento gaúcho que foi referência no país até outubro, perdeu sua credibilidade e acabou sendo politizado. E os números pioraram muito desde então”, avaliou o médico epidemiologista e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal.
Riscos das interações sociais na escola
O presidente da Sociedade Paulista de Infectologia, médico Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza, apresentou na sequência dados sobre a eficiência das restrições e do isolamento. “Há riscos dentro da escola. Há uma série de interações sociais quando se abre a escola, quase inevitáveis, e a transmissão pode existir. É mais difícil ainda de controlar dentro da escola.” O especialista também apresentou dados de escolas abertas em outros países e os reflexos nos índices de contágio. Ele ressaltou que “para abrir”, muitos países fizeram testagem e rastreamento de contato. E enumerou casos de cidades paulistas com aumento de casos de contágio após abertura de escolas.
Taxa de disseminação por crianças
Andressa Stolz, médica oftalmologista que atua na gestão de saúde no hospital da Brigada Militar, defendeu as atividades presenciais no ensino. Ela apresentou slides com gráficos e números e defendeu a segurança das atividades escolares, “com base em dados científicos, dados reais da pandemia e as condutas de países, tanto em ambientes públicos como privados para dar segurança às atividades presenciais”. Argumentou que as crianças têm menor número de casos de covid e baixa mortalidade. “Se formos falar de medos de infecções de terceiros, ou crianças como disseminadores de surtos, uma pesquisa mostrou que raramente crianças são o caso fonte. A cada 100 surtos, 3,8% deles eram uma criança o disseminador inicial da infecção”, sustentou.
A aposta no uso de máscaras e testes
O Coordenador da Vigilância em Saúde de Porto Alegre, Fernando Ritter, comparou casos, número de leitos ocupados, testes realizados, mortes, tempo de espera por leito e o avanço da vacinação. Para ele, “os dados estão melhorando”. Ritter acredita que basta o uso de máscaras para impedir o contágio e apresentou uma estratégia a ser adotadas em casos de surtos. “Nossa orientação é que todos usem máscaras, criamos o COE municipal, testagem de todos que estão entrando e 21 dias depois vamos testar de novo para ver se nossos protocolos estão de acordo, além de olhar dados epidemiológicos para mostrar a atividade do vírus. Os dados irão para a Secretaria de Educação. Temos a central escola, para onde os casos serão noticiados, com servidores da área da educação e saúde. Se houver caso positivo, todos serão testados imediatamente. Foram dadas orientações sobre o espaçamento das classes. É apresentado um desenho e criamos um cálculo de quantidade de alunos por sala, de acordo com a capacidade. Demos orientações sobre uso dos refeitórios também”, argumentou.
Educação e saúde
A Diretora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, Cynthia Molina Bastos, defendeu o modelo de distanciamento controlado que, no seu entendimento “foi didático, dinâmico e aplicado em vários lugares do mundo”. Salientou os aspectos de prevenção e promoção da educação alertou para questões de vulnerabilidade social, violência, abuso e saúde mental. “O papel da educação para área da saúde é muito importante e, exatamente por isso, eu acho que não conseguimos separar completamente educação de saúde por período muito longo. Há um limite de tempo em que se começa a causar mais prejuízo e não pode atrasar. Nesse sentido de gerenciamento de risco violência e saúde, a escola é essencial quando temos visão de saúde que vai além”, lembrou.
*Com informações do TJRS.
Edição: Extra Classe