Como disse Rita Segato, vivemos uma guerra onde as mulheres são o centro do ataque
A pandemia segue descontrolada no Brasil, com o governo Bolsonaro omisso, deixando um rastro de destruição de vidas humanas, de devastação ambiental, desemprego, quebradeira e caos econômico e social.
O governo federal e seus parceiros na política, no sistema financeiro e nas grandes elites oligárquicas assistem impassíveis o país ser destruído pela combinação da pandemia agravada pela omissão do governo que desdenhou da vacina, vem cortando os recursos fundamentais para a saúde, criando o caos. A omissão do governo ao enfrentamento da pandemia e política deliberada de destruição do Estado social provoca um efeito mais violento para as famílias pobres e, sobretudo, para as mulheres, em especial as mulheres negras, as indígenas, imigrantes e suas famílias.
Mesmo diante das múltiplas vulnerabilidades que atingem as mulheres na pandemia, as violências se aprofundam pela postura de desprezo às mulheres e à sua condição de pessoa com direitos, que se ampliou no governo Bolsonaro e seus apoiadores conservadores de extrema direita no Congresso. O ataque aos direitos das mulheres se aprofundou com as práticas clientelistas, de ocupação do campo político orientados por princípios religiosos extremistas que tentam nos impor uma vida de submissão às violências cotidianas como se fosse nosso destino nesta vida.
Para usar uma expressão da antropóloga Rita Segato, vivemos um período em que o poder patriarcal, racial e imperial vem sendo exercido por meio da violência misógina, racista e homofóbica. Um poder político onde a exploração e o controle sobre o corpo da mulher é uma política de Estado. Como disse Segato, vivemos uma guerra onde as mulheres são o centro do ataque.
Sabemos que a violência contra as mulheres na pandemia aumentou e os casos de agressões provocadas pelo machismo e pelo sentimento de “propriedade” sobre nossos corpos faz da violência doméstica, física, sexual, psicológica e econômica uma segunda pandemia, dentro da pandemia. Um dado estarrecedor envolve a violência sexual que atinge crianças, adolescentes e mulheres no Brasil.
Conforme a 14ª Edição do Anuário Brasileiro da Segurança Pública, o Brasil registrou um caso de estupro a cada oito minutos em 2020. A pandemia vem impondo às mulheres, crianças e adolescentes a convivência com os agressores. O aumento da violência de gênero mostra que o Brasil atual é um lugar terrivelmente perigoso para a vida das mulheres e seus dependentes. Não somente os feminicídios tiveram crescimento, como o estupro e o estupro de vulnerável tiveram um aumento nos registros das delegacias em todo o Brasil. A maior parte das vítimas é do sexo feminino e em 84% dos casos o agressor era um familiar ou alguém conhecido da família.
Não bastasse o horror e a brutalidade de um estupro, as mulheres ainda estão sob a ameaça de uma tentativa bestial que tramita no Congresso Nacional que quer impor às mulheres vítimas de um estupro uma gravidez forçada! No Brasil, o aborto é permitido em lei por três situações: risco de vida à gestante; gravidez advinda de um estupro e gestação de feto com anencefalia. No entanto, setores conservadores, religiosos e laicos, tentam por meio do PL 5435/2020, apresentado pelo senador Eduardo Girão (Podemos/CE), impor às vítimas de um estupro uma gravidez forçada.
O PL ressuscita o estatuto do nascituro sob o disfarce de um “estatuto da gestante” para inserir o “direito à vida desde a concepção” na legislação e impedir a realização do aborto inclusive nos casos hoje permitidos pela Lei. A proposta também traz de volta o “bolsa estupro”, ao criar um auxílio para as mulheres que “optarem” (muitas são coagidas por indução religiosa, ameaças ou pela própria morosidade da justiça) a manter uma gravidez resultante de violência sexual.
Movimentos feministas, parlamentares e defensores dos direitos humanos denunciam que o Projeto teve uma tramitação atípica no Parlamento. Andou sem passar por nenhuma Comissão do Senado. E entrou na pauta de prioridades no mês dedicado às mulheres (será ironia ou perversão?). Se não fosse a enorme pressão, o PL teria entrado na pauta da semana passada (Radar Feminista, 30/03/2). Tramitou sem nenhum debate com os movimentos e organizações de mulheres. Em carta pública, a Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto fez um apelo para que nenhuma menina ou mulher seja obrigada a levar adiante a gravidez fruto de um estupro.
O PL 5435/2020, em nome de proteger a vida desde a concepção e as gestantes, pretende na verdade criminalizar as gestantes com direito de abortarem. Seja por risco de vida, por estupro, ou por gestarem fetos anencéfalos. Além de requentar o ‘bolsa estupro’, que é uma aberração, uma proposta macabra para justificar e impor uma gestação que será uma tortura diária para a vítima de tão terrível violência.
Estuprador não é pai! Estupro é crime!! É preciso denunciar e pressionar o Congresso contra o PL 5435, diante de mais esta violência contra as mulheres dentro do contexto em que vivemos de violações incansáveis dos direitos humanos nesta pandemia.
Nenhuma Pessoa deve ser obrigada a gestar filho de um estuprador!
Gravidez forçada é tortura.
*Artigo sustentado na análise produzida pelo Centro Feminista de Estudos e Assessoria, Radar Feminista, de 30/03/21
** Artigo sustentado na análise do Manifesto da FRENTE NACIONAL CONTRA A CRIMINALIZAÇÃO DAS MULHERES E PELA LEGALIZAÇÃO DO ABORTO
R A S P D D e m d e f e s a d a j u s t i ç a r e p r o d u t i v a
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* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko