Rio Grande do Sul

Feminicídio

Força-tarefa de Combate aos Feminicídios do RS define ações prioritárias para 2021

Com aumento de feminicídios na pandemia, grupo cobra que governo gaúcho invista mais em políticas para as mulheres

Brasil de Fato | Porto Alegre |
A atividade virtual ocorreu no final da tarde desta quinta-feira (26) - Reprodução

A força-tarefa de combate aos feminicídios do Rio Grande do Sul apresentou seu programa de trabalho para 2021, em reunião realizada no final da tarde desta quinta-feira (26). A atividade virtual reuniu mais de 50 pessoas representando os poderes do Estado, órgãos de segurança, movimentos feministas e lideranças ligadas aos direitos humanos. 

A força-tarefa é vinculada à Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa. Sua coordenadora, Ariane Leitão, apresentou algumas das prioridades de trabalho para o próximo período. O grupo pede ações do governo gaúcho como principal reivindicação pelo fim da violência contra as mulheres, entre elas a necessidade de levantamento e sistematização de dados e estatísticas, levantamento e busca de recursos para orçamento e investimento em políticas para as mulheres no estado, condições para abrigar e acolher mulheres vítimas de violência e novas campanhas contra o feminicídio.

“O Rio Grande do Sul é o terceiro estado brasileiro que mais matou mulheres em 2019, e é o quarto nesse quesito em 2020. É neste contexto que a força-tarefa tem sua relevância como espaço de articulação para a promoção de políticas públicas em defesa das mulheres”, afirmou. Ela ressaltou que desde 2019, quando foi criada a força-tarefa foi criada, foram realizadas diversas ações e campanhas contra a violência doméstica, e que recursos de emendas parlamentares da bancada gaúcha na Câmara dos Deputados e de deputadas da Assembleia Legislativa foram para combate à violência. Porém destacou que o combate aos feminicídios precisa ter reforço e atenção.

Desde que foi criada, o foco do trabalho é no sentido de garantir que sejam implementadas políticas públicas que defendam a vida e a dignidade das mulheres gaúchas, através de um conjunto de ações entre os parlamentos, a Assembleia Legislativa, a Câmara dos Deputados, o Senado, demais poderes do Estado e os movimentos sociais e de mulheres. Umas das principais cobranças das representações que participaram da reunião, diz respeito à falta de recursos e investimentos por parte do governo gaúcho.

Convidado para integrar a reunião, o governo do estado não enviou representantes. “Um ano depois do início da pandemia, não se percebe o envolvimento do aparato público do governo nem redes de proteção”, cobrou o vice-presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, deputado Jeferson Fernandes (PT). 

Aumento dos feminicídios na pandemia

Conforme números da Secretaria de Segurança apresentados na reunião, somente nos três primeiros meses do ano passado, no período de isolamento da pandemia - março, abril e maio - 28 mulheres foram assassinadas por questões de gênero. Em abril, o aumento foi de 66,7% em relação ao mesmo mês do ano anterior. Ao todo, em 2020, de janeiro a dezembro, 78 mulheres morreram vítimas de feminicídio no estado, 323 registraram ocorrência como vítima de tentativa de feminicídio, 1.908 foram estupradas e 18.944 registraram ocorrência como vítima de agressão com lesão corporal.

Ariane complementou ainda, que no ano passado foram registradas 54 mil notificações de violência doméstica no estado, e que nos três primeiros meses deste ano 15 mulheres foram assassinadas, vítimas de feminicídio. O crime mais recente ocorreu no início da tarde desta quinta-feira, em Sapucaia do Sul, quando uma mulher foi morta pelo ex-companheiro.

O presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, o deputado Edegar Pretto (PT) destacou a relevância do encontro, sobretudo neste período de pandemia, em que a incidência dos feminicídios aumentaram. O deputado informou que a força-tarefa terá atenção especial da Comissão, e que o trabalho será reforçado pelo Comitê Gaúcho ElesPorElas, da ONU Mulheres, do qual é coordenador. 

Pretto diz que, se há violência contra as mulheres, isso é praticado por homens que não entendem que o não de uma mulher é não. “Precisamos conversar e ampliar o debate com os homens. Se há machismo, violência e crime, isso é praticado por eles”, salientou, em referência ao trabalho que desenvolve como coordenador do Comitê Gaúcho ElesPorElas da ONU Mulheres.

O deputado ainda anunciou um programa que será desenvolvido no estado para formar núcleos de homens pelo fim do machismo. “A ideia é criar núcleos reflexivos para debater essa mudança de cultura necessária. A sociedade precisa se movimentar, mas se há vontade de homens mudarem, é pelo protagonismo das mulheres”, apontou. 

Participações

Para a deputada federal Maria do Rosário (PT), que falou em nome da Câmara, o trabalho da força-tarefa é uma referência nacional para os direitos da mulher. “É um trabalho que teve permanência, com pesquisa, análise e diálogo com um conjunto de políticas”, enfatizou.

A deputada estadual Luciana Genro (PSOL), disse que o momento dramático no país, com milhares de mortos e pessoas sem atendimento. “Não é fácil seguir a vida com toda essa tragédia, mas a luta das mulheres não pode parar”, frisou. A deputada ainda falou sobre o aumento de feminicídios, principalmente nos ambientes familiares. Questionou ações do governo gaúcho e afirmou que o governador não está dando atenção à pauta. “ A voz das mulheres gaúchas precisa ser ouvida diante dessa tragédia social da violência e feminicídios”, cobrou.

Abigail Pereira, representante do senador Paulo Paim, também ressaltou a relevância da força-tarefa e o trabalho para mobilizar a sociedade contra a violência doméstica no período de isolamento social. Citou campanhas como a da Máscara Roxa e Rede de Vizinhos e Vizinhas Contra a Violência: vizinha eu te escuto, eu te protejo, eu denuncio!. “Além das mulheres vítimas, vale lembrar que isso resulta num contingente de centenas de crianças órfãs”, observou.

A deputada estadual Sofia Cavedon (PT) disse que a pandemia vitimou as mulheres em maior escala, e que é preciso interromper mecanismos do senso comum e costumes conservadores. “O Estado mínimo é um enfrentamento ideológico, de um Estado que se retira de suas funções. O que as mulheres vivem é uma violência naturalizada, e precisamos inverter isso”, declarou.

A jornalista Telia Negrão, do Coletivo Feminino Plural, leu trechos do manifesto da campanha #NemPenseEmMeMatar, que denuncia o aumento de feminicídio no país. Com o objetivo de denunciar a omissão do Estado e exigir a proteção da vida das mulheres, a campanha foi lançada no Brasil nesta quinta-feira pelo Levante Feminista contra o Feminicídio, que é uma frente suprapartidária apoiada na ideia: “Quem mata uma mulher mata a humanidade!”

Karen Lose, coordenadora executiva do Comitê Gaúcho Eles Por Elas, apresentou números da Campanha Máscara Roxa. Em funcionamento há 9 meses no estado, a campanha resultou em 88 denúncias e duas prisões em flagrante por violência contra mulheres. A média foi de 11 denúncias por mês, em registros feitos em farmácias credenciadas como canais de socorro às vítimas, e atendidos pelos órgãos de segurança. As farmácias foram escolhidas por serem serviços essenciais e permanecerem abertos mesmo nos períodos de maior isolamento da população. A partir disso, foi criada uma rede voluntária com 1.500 farmácias no estado. Os estabelecimentos credenciados como Farmácia Amiga das Mulheres são locais seguros e alternativos. A campanha segue em andamento e recebe denúncias de mulheres vítimas de violência doméstica.

O deputado do PSDB, Faisal Karam, disse que a pauta preocupa, principalmente na pandemia. “As mulheres vivem com insegurança e medo”, afirmou. O deputado sugeriu já pensar ações para o pós-pandemia, e como as populações que vivem esses dramas serão atendidas. “Tivemos bons resultados na segurança do estado, mas em relação às mulheres não”, pontuou.

A delegada Jeiselaure de Souza, diretora da Divisão de Proteção e Atendimento à Mulher (Dipam) e titular da 1ª Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher de Porto Alegre (Deam), lembrou que as delegacias são as primeiras portas para denunciar crimes e violências. Ressaltou que os casos de violência contra as mulheres precisam de profissionais que façam o acolhimento, e que a Polícia Civil e Brigada Militar não pararam o trabalho na pandemia, principalmente com trabalho para execução de mandados de busca e apreensões.

Outras mulheres, representando movimentos feministas, também se manifestaram em relação ao trabalho da força-tarefa, e reafirmaram que o Parlamento gaúcho tem papel importante para dar espaço aos temas e vozes em defesa da vida.

*Com informações da Agência de Notícias da ALRS


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Edição: Marcelo Ferreira