Mais que nunca, a fraternidade e o diálogo são necessários, urgentes e necessários
A pandemia e a morte estão no cotidiano de nossas vidas como nunca estiveram: parentes, amigas, amigos, companheiras e companheiros, a encher de dor e silêncio famílias e comunidades.
A fome, a miséria e o desemprego atingem milhões de brasileiras e brasileiros. Disse Frei Orestes, vigário da Paróquia Santa Clara da Lomba do Pinheiro, periferia de Porto Alegre, em reunião do Núcleo de Reflexão Política da Lomba do Pinheiro, dias atrás: “A fome está voltando e aumentando aceleradamente. Precisamos reforçar, como prioridade máxima, o Comitê Popular contra a Fome e o Coronavírus, na ausência de políticas públicas e na falta de ação dos governos.”
A violência e o racismo cercam as comunidades e ameaçam vidas. O ódio e a intolerância circulam nas redes sociais, junto com as Fake News, muitas vezes inclusive em espaços religiosos e de Igrejas. Feminicídios, assassinatos de jovens negros fazem parte do cotidiano das vidas de todas e todos, muitas vezes quase como se já fossem naturais e normais.
Neste contexto de sofrimento e morte, em todos os sentidos, acontece a V Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021 (CFE 2021), com o lema ‘Cristo é a nossa Paz: Do que era dividido, fez uma unidade’ (Ef, 2, 14a) e com o tema ‘FRATERNIDADE E DIÁLOGO: COMPROMISSO DE AMOR’.
Mas, sinais dos tempos. A Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021, coordenada pelo CONIC, Conselho Nacional das Igrejas Cristãs, com lançamento esta semana, na quarta-feira de cinzas, 17 de fevereiro, entrou na rota dos conservadores de plantão. Setores conservadores da Igreja Católica, em especial, liderados por alguns bispos, dizem que não concordam com a CFE 2021, e não vão assumi-la. O principal alvo das críticas e de ataques violentos é a Pastora luterana Romi Bencke, Secretária Executiva do CONIC, que assina a Apresentação da CFE-2021.
Diz Dom Fernando Guimarães, Arcebispo Ordinário Militar do Brasil, expressando a posição de vários outros bispos: “A evangelização dos fiéis, no entanto, em qualquer tempo e ainda mais em um tempo especial como é a quaresma católica, não é espaço de dialogar sobre temas polêmicos e contrários à autêntica doutrina de nossa igreja.” E diz Dom Gil Antônio Moreira, bispo de Juiz de Fora: “Houve uma grave falha com relação ao texto-base que tem provocado séria polêmica, por apresentar conceitos duvidosos em relação à doutrina social e à Moral cristã, em sua redação e na sua subjacência, sendo a autora adepta de correntes morais não aceitas pela Igreja Católica e nem por grande parte dos nossos irmãos evangélicos.” E comunica o bispo: “Após ler, ouvir e ver praticamente todos os posicionamentos prós e contra, em consciência, e para ser fiel à Igreja, oriento que o texto-base da CFE 2021 não seja utilizado na nossa Igreja particular.”
Mas o que diz e prega a Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021, quando fala de ‘Fraternidade e Diálogo, Compromisso de Amor’?
“A paz é nosso horizonte. Ela passa necessariamente pelo enfrentamento das desigualdades econômicas”, escreve a Pastora Romi Bencke, na Apresentação do Texto-Base da V CFE. “Ela (a paz) passa necessariamente pelo enfrentamento das desigualdades econômicas. Todos sabemos que o Brasil é um dos mais desiguais do mundo. Aqui, a elite econômica, formada por 1% das pessoas mais ricas, não sente mais constrangida em ganhar 33,7 vezes mais do que os 50% mais pobres da população brasileira. Como falar de paz, quando pessoas passam fome e não têm trabalho, nem terra e teto? Como falar em paz, sem denunciar essas injustiças econômicas, sociais e ambientais?”
Escreve ainda a Pastora Romi: “Cada uma das Campanhas da Fraternidade Ecumênicas sinaliza que o diálogo é o nosso melhor testemunho. A fé nos lembra que Cristo é nossa paz e nos anima a prosseguir pelo caminho da unidade na diversidade. A Boa-Nova do Evangelho nos une e acolhe nossas diferentes experiências de testemunho cristão. A escolha por testemunhar a fé vivida em diversidade desafia-nos para realizar a Campanha da Fraternidade Ecumênica 2021. Com ela, afirmamos que a fraternidade e o diálogo são compromissos de amor, porque Cristo fez uma unidade daquilo que era dividido.”
Estamos em tempos em que, mais que nunca, a fraternidade e o diálogo são necessários, urgentes e necessários, em vez de se estimular a compra, venda e posse de armas. Tempos em que fraternidade e diálogo são proféticos.
A Campanha da Fraternidade 2021, depois de VER e JULGAR a realidade, propõe no AGIR da ‘Fraternidade e Diálogo, Compromisso de Amor’: 1. Promoção do diálogo ecumênico, com a realização da Semana de Oração pela Unidade cristã: ‘A Semana de Oração é um exemplo concreto de testemunho público da unidade na diversidade.’ 2. Convivência inter-religiosa: ‘Uma das grandes belezas do Brasil é a sua diversidade religiosa.’ 3. Superação da violência: ‘Realização das missões ecumênicas junto e com os povos indígenas.’ 4. Superação da violência contra as mulheres: ‘Encontro Ecumênico de Mulheres e ato ecumênico em memória delas. A história do cristianismo foi construída com a forte presença e atuação das mulheres.’ 5. Cuidado da Casa Comum: ‘Que esse caminhar seja em fraternidade, diálogo e como compromisso de amor, edificando pontes!’
Assim, cristãs e cristãos, companheiras e companheiros de caminhada de todas as igrejas e religiões, todas e todos que acreditam na vida, mesmo não tendo fé religiosa, estão convidadas/os a tomarem a vacina da fraternidade e do diálogo, e transformarem 2021 no ano da solidariedade, do ninguém solta a mão de ninguém, do inédito viável e do ESPERANÇAR, no ano do centenário de Paulo Freire.
Hora de todas e todos de boa vontade juntarem-se às palavras da Pastora Romi, no final da Apresentação do Texto-Base: “Ecoando o Hino da CFE 2021, convidamos todas e todos a participarem desta grande ciranda ecumênica do diálogo e do amor: ‘Venham todas e todos, vocês, venham todas e todos/, reunidas, reunidos num só coração/, de mãos dadas formando a aliança,/ confirmadas, confirmados na mesma missão’.”
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira