Rio Grande do Sul

Poema

Dieguito, uma homenagem do cineasta Carlos Pronzato a Maradona

"As lágrimas do povo para seus ídolos, só as entendem os domingos", diz poema do cineasta argentino, radicado no Brasil

Porto Alegre | BdF RS |
Adeus a Maradona comove a Argentina e fãs no mundo todo - Divulgação

DIEGUITO

As lágrimas do povo 
Para seus ídolos 
Só as entendem os domingos 

Quando no chão duro do campo de várzea
Orvalho cristalino
Um estalo matinal foi ouvido
- Um sopro de outro mundo 
com cheiro de choripán -
Alguém disse:
Nasceu uma lenda 
Com as veias abertas 
Das favelas

Os joelhos 
Encharcados no sangue 
Do barro do subúrbio
E uma canhota que desloca 
O eixo do planeta

Não há Bíblia que torça seu caminho
Que o penteie com brilhantina
e o crave como um número
na máquina trituradora da vida

Não há molde conhecido
Que corte as asas do seu destino

O que ele quer é o abismo
Um vento a contramão
A proa de cara suja avançando 
Na turbulenta máfia da Fifa
Para voar com penas coloridas
Ao encontro do povo 
Sedento de alegrias 
E driblar a miséria 
Por pelo menos 90 minutos

Os ídolos sabem
Que não tem muito tempo de vida 
- útil -
A magia
A arte
A beleza de um gol contra os ingleses 
Dura menos que uma mão de Deus 
Estendida desde o céu 

Quando fazia embaixadinhas
Tudo isto já o sabia 
As asas cresceram pouco a pouco 
E se foi para Nápoles 
Jogar como jogava no Argentinos Jrs.

Ao Che o levou tatuado 
Para dar um cruzado de esquerda
A qualquer arrogante 
Que se ponha na sua frente
Um rapaz da favela
Não pode andar desarmado
No país dos ricos

Mas um dia ele nos deixou
como um anjinho
com a bola debaixo do braço
e assobiando baixinho.

As lágrimas do povo
Só as entendem os domingos.

Carlos Pronzato
Macapá, Brasil, 26.11.2020


DIEGUITO

Las lágrimas del pueblo
por sus ídolos
solo la entienden los domingos

Cuando en el duro piso del potrero
rocío cristalino
se escuchó un crujido matinal
un soplo de otro mundo
con olor a choripán
alguien dijo:
nació una leyenda
con las venas abiertas
de las villas

Las rodillas
encharcadas de la sangre
del barro del subúrbio
y una zurda que descoloca
al eje del planeta

No hay Biblia que tuerza su camino
lo peine a la gomina
y lo incruste como un número
en la máquina trituradora de la vida

No hay molde conocido
que le corte las alas del destino

Lo que él quiere es el abismo
un viento a contramano
la proa carasucia avanzando
en la turbulenta mafia de la Fifa
para volar con piel de cebollita
al encuentro del pueblo
sediento de alegrias
y hacerle una gambeta a la miseria
por lo menos por 90 minutos

Los ídolos saben
que no tienen mucho tiempo de vida
- útil -
la magia
el arte
la belleza de un gol a los ingleses
dura menos que una mano de Dios
extendida desde el cielo

Cuando hacia jueguito
todo esto lo sabía
las alas le crecieron de a poquito
y se fue a Nápoles
a jugar como jugaba en Argentinos

Al Che se lo llevó tatuado
para darle un cross de izquierda
a cualquier lungo prepotente
que se le ponga en frente
un pibe de la villa
no puede andar desarmado
en el country - Estado de los ricos

Pero un dia se nos fue
como un angelito
con la pelota bajo el brazo
y silbando bajito

Las lágrimas del pueblo
por sus ídolos
solo la entienden los domingos

Carlos Pronzato
Macapá, Brasil, 26.11.2020

Edição: Katia Marko