Nesta terça-feira (17), a artista visual e pesquisadora Alice Bemvenuti, em parceria com o jornalista, fotógrafo e produtor de vídeo, Luís Vieira, inaugura uma performance artística realizada na Vila dos Ferroviários, em Porto Alegre, através da Virada Sustentável.
O trabalho, que será apresentado a partir das 20h10 pelo canal da Virada Sustentável no Youtube e pela página no Facebook, se configura em uma mostra com imagens e atuação da artista. Inicialmente, o trabalho deveria ser realizado presencialmente no Grêmio Esportivo Ferrinho, instalado na própria Vila dos Ferroviários, porém com as alterações na programação devido às exigências do distanciamento social, a alternativa foi oferecer uma transmissão ao vivo da programação através das plataformas na rede social.
O trabalho “Memória em Risco – Vila dos Ferroviários” será apresentado em uma live, com dois momentos distintos: na primeira parte serão mostrados vídeos com duas partes da performance, logo após se inicia um debate tendo como convidados moradores da Vila dos Ferroviários.
Os vídeos que mostram a performance apresentam imagens da Vila projetadas sobre o corpo da artista. Essas imagens são um veículo de reflexão do contexto que Alice nos convida a perceber, como uma provocação e um encontro com as diferentes questões que o projeto aborda e denuncia, envolvendo os riscos e apagamentos da memória e do patrimônio.
Nos últimos dez anos, Alice Bemvenuti tem se dedicado a realizar caminhadas nas ruas da Vila dos Ferroviários em Porto Alegre, mas seu encontro com o lugar se deu através das interrogações como gestora do Museu do Trem de São Leopoldo ainda em 2009. Ao longo dos anos desenvolveu projetos não só pelo Museu, mas também projetos independentes como pesquisadora, assim como desenvolveu atividades acadêmicas vinculadas à Universidade (Ulbra-Canoas), através da qual deu aulas no curso de Fotografia, e recentemente como oficineira do Ponto de Cultura Ferrinho.
Neste projeto, em especial, a performance artística revê a memória, mas também se manifesta através de uma linguagem audiovisual cheia de sobreposições e evidências do lugar que foi palco da ferrovia desde a primeira metade do século XX.
O resultado poderá ser conferido na performance: “Memória em Risco - Vila dos Ferroviários” protagonizado por Alice e Luís, tendo como convidados o ferroviário aposentado, guardião da memória do local, Hélio Bueno da Silveira, e Bianca Danzmann Silveira, fotógrafa filha de Danilo Cigaran Silveira, maquinista ativo na Rumo Logística.
Veja abaixo a entrevista com Alice
O que motivou a elaboração desta performance?
Alice Bemvenuti - Tenho realizado inúmeros projetos na Vila dos Ferroviários, tanto acadêmicos onde sou pesquisadora, quanto atividades de formação e de relação com a comunidade. A minha convivência na Vila tem me oportunizado a olhar de perto questões muito específicas de como a memória se dá entre os moradores, mas também relacionadas ao viver nesse local, hoje. Em cada casa, em cada morador, em cada voz, percebo uma fonte de memória e muitas questões que estão ou não relacionada diretamente à ferrovia, mas são histórias de pessoas trabalhadoras, brasileiras. O local me motiva não só pelo que ele oferece como memória, mas pela acolhida que tive entre moradores e moradoras desde meu primeiro projeto. Tenho hoje contato com pessoas como Dona Silvia ou Dona Margarete, que me contam de suas tarefas diárias; ou como Seu Hélio que liga para falar dos ataques ao patrimônio ferroviário.
Por que um trabalho de arte?
Alice - As minhas inquietações como pesquisadora acadêmica têm um lugar muito especial que se mistura com a Alice artista, curiosa e pulsante. São processos que caminham juntos, mas que sempre parecem estar disputando um lugar de verdade e de definição como, inclusive dentro de mim. Porém, todas as questões de memória estão marcadas na linha da pele e me atravessam fortemente todos os dias. Eu respiro esse estado de memória e de agora. Estou colecionando a convivência com os ferroviários e a performance oxigena e impulsiona outras relações sobre o cotidiano e com as pessoas e o lugar que tem me nutrido durante mais de uma década.
Também me vejo retomando esse lugar da arte como produção de conhecimento. Sempre pintei (tela e pincel mesmo) e sempre tive a fotografia como objeto de trabalho, mas agora essa assume outra dimensão, ela acontece como projeção e sobreposição. Uma produção em arte fica no corpo anos, vai se formando à medida que as questões vão sendo vividas. A performance revela, de modo explícito, o que tenho acumulado durante esses anos e com essas experiências. A linguagem oferece a carne (viva) e tudo que se acumula sobre ela. De fato, um processo intenso, amoroso e necessário. Recupero a mim também nessa forma de falar sobre a memória de um lugar e sobre o sujeito artista.
Você já teve outros projetos aprovados pela Virada Sustentável?
Alice - De fato, sim. Essa é a segunda vez que sou contemplada. Em 2018, a proposta foi como curadora da exposição: Vila dos Ferroviários – Memórias e Resistência, que apresentou 82 fotografias documentais realizadas em caminhadas na vila, incluindo a participação do fotógrafo Jorge Aguiar. E junto um debate sobre Mobilidade, Memória e Cidade.
Edição: Katia Marko