No dia 28/10, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode iniciar o julgamento que definirá os rumos das demarcações das Terras Indígenas no Brasil. O que está em jogo é o reconhecimento ou a negação do direito mais fundamental aos povos indígenas: o direito à terra.
Há duas teses em disputa: de um lado, a chamada “teoria do indigenato”, que reconhece o direito territorial dos povos indígenas como “originário”, segundo os termos da Constituição; do outro lado, está uma proposta que restringe os direitos desses povos às suas terras ao reinterpretar a Constituição com base na tese do chamado ‘marco temporal’. Nessa interpretação, defendida por ruralistas, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição, ou que, nessa data, estivessem sob disputa física ou judicial comprovada.
Entenda o caso
Tramita no STF um pedido de reintegração de posse (Recurso Extraordinário 1.017.365) movido pela Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (Farma) contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e indígenas do povo Xokleng, envolvendo a Terra Indígena Ibirama-Laklanõ, área reivindicada e já identificada como parte de seu território tradicional, também habitado por populações Guarani e Kaingang.
O Recurso teve a repercussão geral reconhecida pelo plenário do STF em 2019. Isso significa que o que for julgado nesse caso servirá para fixar uma tese para todos os casos envolvendo demarcações de terras indígenas, em todas as instâncias do judiciário.
O que está em jogo?
Por isso, a decisão da Suprema Corte irá impactar o futuro de centenas de populações indígenas, já que a aplicação do marco temporal pode dificultar ainda mais as demarcações, indispensáveis à sobrevivência desses povos, à pacificação de conflitos territoriais históricos, além de coibir a violência resultante de invasões e atividades ilícitas, como grilagem de terras, garimpo e extração madeireira.
A existência dos povos indígenas isolados também estará ainda mais ameaçada caso a votação seja favorável à tese do marco temporal. Isso porque, por seu modo de vida nômade e avesso ao contato, é impossível comprovar a presença desses grupos em 5 de outubro de 1988 nas terras que hoje habitam ou que estivessem reivindicando formalmente o reconhecimento de seus territórios. O Estado brasileiro até hoje não conseguiu confirmar exatamente quantos são e onde estão essas comunidades especialmente vulneráveis.
Na avaliação de indigenistas, juristas, lideranças indígenas e do Ministério Público Federal (MPF), o marco temporal é uma tese perversa, pois legaliza e legitima as violências a que os povos foram submetidos até a promulgação da Constituição de 1988, em especial durante a Ditadura Militar.
“Essa posição ainda ignora o fato de que, até 1988, os povos indígenas eram tutelados pelo Estado e não tinham autonomia para lutar, judicialmente, por seus direitos. É por esse motivo que o mote para a campanha de mobilização indígena para derrubar a tese do marco temporal é: “Nossa história não começa em 1988”, explica Rafael Modesto, advogado do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
O julgamento foi colocado em pauta pelo presidente do Supremo, o ministro Luiz Fux, e será realizado de forma telepresencial, devido a pandemia do novo coronavírus. As partes terão até 15 minutos para se manifestar, já os amici curiae – amigos da corte -, terão ao todo, 30 minutos para sustentação oral.
* Por Assessoria de Comunicação do CIMI/MNI
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Edição: Conselho Indigenista Missionário