Para Reich o orgasmo seria a manifestação no ser humano de funções biológicas profundas e primitivas
Seria possível estabelecer parâmetros biologicamente fundamentados do que é um ato sexual natural? Pois essa foi uma das tarefas a que Wilhelm Reich se dedicou ao longo de sua pesquisa. Se ele postulava que as enfermidades psíquicas provinham de um distúrbio da capacidade individual de obter satisfação das necessidades sexuais, seria completamente coerente estabelecer o que seria, do ponto de vista orgânico, a sexualidade genital natural.
No artigo de hoje vou me dedicar a resumir o ato sexual natural segundo descrito por Reich em A Função do Orgasmo. Para ele, o primeiro é dividido em duas fases. A primeira delas é marcada pela possibilidade de controle voluntário por parte das funções superiores do psiquismo. A segunda é governada unicamente pelo processo bioenergético.
Fase do controle voluntário
A excitação sexual leva ao entumescimento dos órgãos genitais. Esse processo ocorre sem dores ou desconforto. Os parceiros sexuais mostram-se ternos um em relação ao outro. Não há impulsos contraditórios, tais como agressividade ou ambivalência afetiva.
Nas mulheres há o desejo de ser penetrada, nos homens, o desejo de penetrar. Tanto a mulher quanto o homem são ativos no ato sexual.
Com a penetração, a excitação agradável aumenta subitamente nos parceiros. Nos homens, o desejo de penetrar aumenta, mas sem que este assuma a forma sádica de querer “perfurar” ou “atravessar” o parceiro(a). Na mulher ocorre o desejo de “absorver” com a vagina.
A consciência está inteiramente dirigida para a assimilação das sensações de prazer. O ego participa ativamente, na medida em que tenta explorar todas as possíveis fontes de prazer e atingir o mais alto grau de tensão antes do momento do orgasmo. Entregar-se pressupõe a mais completa concentração nas sensações ondulantes de prazer.
Quanto mais lentas e delicadas são as fricções, e mais estreitamente sincronizadas, mais intensas são as sensações de prazer. Isso pressupõe uma grande afinidade entre os parceiros. Ao continuar a fricção, a excitação aumenta, tomando, gradualmente, posse do corpo inteiro, enquanto o genital mantém um nível relativamente constante de excitação. Esse fenômeno prepara o início da segunda fase do ato sexual.
Fase das contrações musculares involuntárias
Nesta fase, o controle voluntário do desenvolvimento da excitação não é mais possível. Esta domina a personalidade total e causa aceleração do pulso e exalações profundas, bem como contrações involuntárias de toda a musculatura das regiões genital e pélvica, que são experimentadas na forma de ondas.
Neste estágio, a interrupção do ato sexual é totalmente desagradável tanto para a mulher quanto para o homem, podendo ser, inclusive, dolorosa. Por meio de uma nova intensificação e do aumento da frequência das contrações musculares involuntárias, a excitação sobe rápida e intensamente em direção ao clímax.
Neste ponto a consciência se torna mais ou menos nublada. Seguindo-se a uma pequena pausa no auge do clímax, as fricções aumentam espontaneamente e o desejo de penetrar completamente, nos homens, se torna mais forte a cada contração ejaculatória. Nas mulheres, durante o orgasmo, também há contrações involuntárias da musculatura vaginal, acompanhadas pelo desejo de “receber completamente”.
A excitação orgástica toma conta do corpo inteiro e produz fortes convulsões na musculatura. O alívio da tensão sexual é experimentado como uma descarga motora e o resultado é uma reversão ao corpo da excitação genital (isto é, a excitação reflui dos genitais para o restante do corpo). Isso é experimentado como uma súbita redução da tensão. Esta desaparece e é substituída por um agradável relaxamento físico e psíquico e pela vontade de dormir. A sensualidade na relação é abrandada e aparece em relação ao parceiro uma atitude saciada e terna, com o sentimento de gratidão.
Para Reich o orgasmo seria a manifestação no ser humano de funções biológicas profundas e primitivas. A possibilidade de satisfazermos a essa lei da natureza garantiria nossa sensação de identidade e pertencimento ao universo vivo e cósmico. Por outro lado, ao enrijecermos nosso organismo a ponto de impedirmos nele o movimento energético e emocional, desenvolvemos formas artificiais e antinaturais de comportamento, e perdemos nossa identificação com o restante da natureza viva e não viva.
Apesar disso, o anseio cósmico – o anseio por fusão – não deixa de povoar o imaginário dos seres humanos que, tendo perdido em sua maioria a capacidade de experiência direta desse pertencimento, fingem se contentar em cantar saudosa e sentimentalmente essa unidade em poemas, rezas e discursos.
Descrição da imagem: trata-se de uma ilustração. No centro da imagem, um casal. O homem tem a pele rosa e os cabelos e roupa brancos, a mulher idem. Ele está sentado no chão de uma floresta. A mulher, que tem os cabelos compridos e veste uma túnica, está sentada no colo dele. Em volta dos dois, três linhas coloridas, azul, amarela e rosa, descrevem o que seria uma espécie de aura que os envolve. O chão da floresta e a copa das árvores tem a mesma cor da aura deles. A aura se funde na floresta. As árvores têm o tronco na cor branca. Ao fundo da imagem, depois das árvores que vão ao infinito, há três círculos, um azul, um rosa e um amarelo.
Edição: Katia Marko