A segunda-feira começa com movimentações que marcam o dia 28 de setembro, dia de luta pela descriminalização do aborto na América Latina e Caribe. Em Porto Alegre, a Frente Pela Legalização do Aborto do RS (FREPLARS), em articulação com diversas organizações feministas, realiza intervenções em monumentos e espaços públicos pela cidade. As ações visam incentivar o debate da pauta que deveria ser de todos: a luta pela autonomia dos corpos femininos e proteção da vida das mulheres. Além das intervenções, o dia também é marcado por uma live com a advogada Domenique Goulart e com a psicóloga Ana Maria Bercht, às 19h, pela página da FREPLARS no Facebook.
Domenique é feminista e antirracista, mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais (PPGCCRIM) da PUCRS e sócia da Themis - Gênero, Justiça e Direitos Humanos. Graduada pela Faculdade de Direito da UFRGS, foi cofundadora do Grupo Interdisciplinar de Trabalho e Assessoria para Mulheres, do SAJU. Já Ana Maria é ativista feminista (FREPLA-RS), Doutoranda em Psicologia Social (PUCRS) no grupo Preconceito, Vulnerabilidade e Processos Psicossociais (PVPP). Compõe também o grupo Epistemologias, Narrativas e Políticas Afetivas Feministas CNPq/PUCRS.
Contra a criminalização das mulheres e pela legalização do aborto
A cada ano, o 28 de setembro - Dia de luta pela descriminalização do aborto na América Latina e Caribe - vêm ganhando cada vez mais força. Em 2020 ele traz a potência de debates emergentes e recentes que vivenciamos no Brasil. Há um mês, o Ministro da Morte, Eduardo Pazuello, publicou a Portaria 2282/2020 impondo mais dor e humilhação para vítimas de estupro, além de violar o sigilo no serviço de saúde, previsto pelo código de ética ao condicionar o acesso ao aborto legal a notificação a autoridade policial.
A FREPLA-RS considera o projeto "fascista-misógino-machista", pois ignora dados alarmantes divulgados no ano passado pelo 13° Anuário de Segurança Pública: em 2018, foram registrados 66 mil casos de violência sexual, correspondendo a 180 estupros por dia. Entre as vítimas, 54% eram meninas de até 13 anos.
Isso remete ao caso amplamente divulgado, também no mês passado, que pode ter influenciado na Portaria 2282/2020. Uma menina do Espírito Santo grávida aos 10 anos, como resultado de abusos que sofria há quatro anos. Uma criança que teve que fazer uma peregrinação para ser acolhida por um atendimento que é seu direito. A garota, que era violentada por familiares, foi também violentada pelo Estado e pela parcela da população que a torturou publicamente querendo impedir o procedimento em frente ao hospital.
Para além da questão geracional, a criminalização do aborto também é uma questão de classe e raça. De acordo com a Pesquisa Nacional do Aborto (PNA), de 2016, entre as que optaram pela interrupção voluntária da gravidez estão mulheres com grau de escolaridade baixa, negras, pardas e indígenas; habitantes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Por que América Latina?
A América Latina está na relação das regiões que concentram dados relevantes sobre o abortamento clandestino inseguro. Entre 2010 e 2014, foram registrados mais de 25 milhões de abortos sob tais condições, sendo 97% dos casos em países da África, Ásia e América Latina. Os dados foram divulgados em 2017, em uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Instituto Guttmacher. O documento também analisou o contexto social e legal dos locais que apresentam os maiores índices de procedimentos inseguros. Nos países onde a proibição ocorre de forma irrestrita ou o procedimento só é considerado em caso de risco de vida da gestante, um em cada quatro abortos é seguro. Este é o cenário da América Latina. Por outro lado, em nações onde o procedimento é descriminalizado, nove entre dez são feitos sob condições que garantem a saúde da mulher.
* Com informações da FREPLARS
Edição: Marcelo Ferreira