Com uma população estimada em 247.032 habitantes, sendo cerca de 177 mil eleitores, a cidade de Novo Hamburgo, situada no Vale dos Sinos, já foi tida como a capital nacional do calçado, e traz isso no monumento da cidade. A cidade de colonização alemã, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tem 88.464 pessoas ocupadas, ou seja 35% da sua população. Tem taxa de escolarização de 6 a 14 anos de idade de 97 % e o Produto Interno Bruto per capita é de R$ 35.013,51.
Na área da saúde, possui 37 estabelecimentos pelo SUS. A primeira UPA 24h (Unidade de Pronto Atendimento) do estado foi inaugurada na cidade, no bairro Canudos, em novembro de 2011, quando Tarcísio Zimmermann (PT) era prefeito do município. Também na sua gestão foram criadas 13 unidades básicas, espalhadas pela periferia da cidade, e implantada a estratégia de saúde da família.
Gestor do município entre 2009 a 2012, Tarcísio, e a vice Carla Atkinson (PCdoB), concorrerão à prefeitura da cidade. Eles têm o objetivo de retomar o que foi feito durante os oito anos de gestão do Partido dos Trabalhadores (Luis Lauermann sucedeu Tarcísio na gestão municipal) e que, na avaliação da chapa, foi descontinuado na atual gestão.
Terão pela frente uma disputa com cinco chapas de direita, sendo três ligadas ao que eles chamam de "trio cloroquina". São elas a coligação Aliança por Novo Hamburgo (Republicanos, PRTB), Unidos por Novo Hamburgo, que tem a atual prefeita da cidade tentando a reeleição (PSDB, MDB, PTB, PDT, PSC, PSD, PSB, Cidadania, Avante), a Coligação Endireita Novo Hamburgo (PP, PSL, PL, Patriota, Podemos), e mais as candidaturas do DEM e do PTC.
Para o embate, os candidatos terão o apoio do PSol, que juntos formam a coligação Digo Sim (PT, PCdoB e PSol). “Era o time dos sonhos. Tínhamos uma grande expectativa de conseguirmos construir a unidade das forças populares, do campo progressista, da luta por direitos, da luta pela democracia, da luta pela soberania do país, da luta pelo meio ambiente e conseguimos. Estamos com uma aliança que envolve o PT, PCdoB e também o PSol. Estamos unidos e enfrentaremos cinco outras chapas, cinco candidaturas do campo conservador da direita”, salienta Tarcísio.
Para a chapa, um dos grandes desafios para a próxima gestão será contornar os efeitos da covid-19 nos mais diversos setores. A cidade hamburguense é a sexta colocada no números de casos de infectados entre os municípios gaúchos, e contabiliza 162 vítimas fatais.
Tarcísio e Carla são os convidados da segunda edição do debate A Cidade que Queremos, ciclo de entrevistas em vídeo com candidatos do campo popular de Porto Alegre, região Metropolitana e interior do estado, para debater suas propostas.
Abaixo, por tópicos, trechos da entrevista:
Saúde
Carla Atkinson - A nossa proposta na saúde consiste retomar uma saúde que já foi grandiosa na nossa cidade. Novo Hamburgo foi protagonista, inaugurou na época em que o Tarcísio foi prefeito a primeira UPA do estado. O sistema de saúde de Novo Hamburgo foi abandonado durante a atual gestão. Há queixas de filas, de mal atendimento, de poucos médicos nos postos de saúde. Em muitas Unidades Básicas de Saúde não têm um serviço essencial que é o de ginecologia e obstetrícia, por exemplo. Caso nos elejamos teremos toda uma demanda reprimida de cirurgias eletivas que foram suspensas durante a pandemia e toda essa demanda é uma questão que precisa ser atendida. Uma das propostas consiste em viabilizar um atendimento daquilo que as pessoas ainda chamam de Posto de Saúde aqui na região mais central da cidade.
Tarcísio Zimmermann - Vamos cuidar de fortalecer a estratégia de saúde da família, fortalecer o trabalho dos agentes comunitários, e o esforço preventivo da educação para saúde. Fortalecer a vigilância em saúde e trabalhar para implantar uma medicina mais natural. Nós não temos ainda aqui em NH uma tradição de usar no sistema de saúde terapias alternativas, como por exemplo quiropraxia. Pretendemos levar isso para as unidades básicas de NH. Querermos nos emparceirar com a Pastoral da Saúde e articular um programa de hortas comunitárias.
O grande tema que teremos que enfrentar imediatamente é o da covid. O estado do RS não fez nenhum passo para conseguir as vacinas. Precisaremos nos habilitar em relação a isso. Aqui na cidade teve discussão sobre a cloroquina, um negócio que é desprezado no mundo inteiro. A atual prefeita foi à Brasília pedir cloroquina para o governo federal. Os médicos do município não estão receitando. Veio 35 mil doses de cloroquina para cá e até semana passada tinham sido receitadas 160 doses.
Educação
Tarcísio - Eu não gosto da ideia de que perdemos um ano. Acho que estamos tendo um ano de aprendizado. Claro que temos que retomar as aulas da melhor forma possível. Acho que a primeira questão continua sendo enfrentar a covid, precisamos ter a vacina. Mas, enquanto isso, temos que estabelecer um pacto com as direções das escolas, com a comunidade escolar, no sentido de retomar uma a educação de qualidade nas melhores condições possíveis. E retomar essa educação, inclusive, dentro de uma estratégia de reduzir as diferenças de desigualdades que são produzidas pela situação socioeconômica dos nossos alunos.
O governo precisa ser um governo de diálogo, capaz de construir estratégias em conjunto com os servidores públicos, com a comunidade e ao mesmo tempo dar os bons exemplos, no sentido de ter proposições, mas não de impô-las da forma como está sendo feito aqui na cidade no último período.
Carla - Essa retomada (aulas) parte de muito diálogo com a comunidade escolar. Quando janeiro chegar é que a gente vai poder ver exatamente a dimensão do problema, o que foi feito e o que não foi feito. Mas tem um ponto que acho que ficou muito gritante durante essa pandemia, que é o acesso à tecnologia. O que se verificou é que apenas um grupo, uma parcela da sociedade, tem acesso pleno à internet. A maior parte da população tem acesso apenas às redes sociais, porque teoricamente é de graça.
Essa questão do acesso à tecnologia é uma das questões que a gente vai precisar dar uma atenção muito especial porque ninguém está livre dessa situação, de ter outros episódios em que os alunos tenham que se recolher novamente e a gente ficar neste vazio. A educação de NH ficou em um vazio durante mais de cinco meses, onde simplesmente a Secretaria de Educação ficou de braços cruzados aguardando que um milagre acontecesse até tomar uma iniciativa.
Cesta Básica e acesso ao alimento
Tarcísio - Além do tema de enfrentar a covid e o esforço de recuperar a economia, teremos de nos ocupar do problema da fome, o problema da falta de alimento na mesa das pessoas. Nesse campo entra uma parceria importante com o movimento dos produtores rurais, dos agricultores, com o Movimento dos Sem Terra, que tem dado exemplos extraordinários nessa pandemia fazendo doações gigantescas de alimentos orgânicos em todo nosso país. Queremos ter também a parceria com a comunidade organizando hortas comunitárias.
Queremos ter uma articulação muito intensa com o Movimento dos Pequenos Agricultores, com as cooperativas dos pequenos agricultores, com as cooperativas da reforma agrária, para compra a merenda escolar e outros segmentos. Temos uma estrutura que exige um esforço alimentar grande. Vamos incentivar também as cozinhas comunitárias. Isso tudo são movimentos que precisaremos estimular em um primeiro momento para evitar a fome do nosso povo.
Carla - A questão das hortas já é bastante tradicional em NH, temos um bairro rural que é a Lomba Grande. É uma tradição na cidade a feirinha que é realizada no centro da cidade. O primeiro passo é o compromisso de manter o apoio aos pequenos produtores, à essa indústria familiar. No início da atual gestão esses produtores sofreram um forte ataque, onde se tentou restringir o comércio de alguns produtos.
Aqui na cidade temos a horta comunitária Joanna de Ângelis que faz uma produção muito bacana, que distribui aquilo que eles produzem. A questão da horta comunitária, além de alimentar as pessoas, tem um papel muito educativo, porque ela ensina as pessoas que é possível produzir comida sem agrotóxico, sem veneno. Tem também o pessoal da Feira Viva, que reúne produtores orgânicos na cidade. Então já existe uma cultura na cidade, e essa cultura precisa de um pouco mais de valorização e incentivo.
Estado mínimo
Carla - Esse processo de privatização vem se infiltrando por dentro da nossa jornada já faz algum tempo. Nós de partidos defendemos que o Estado é que deve cuidar das pessoas e que serviço público deve ser um serviço de excelência. Acreditamos na valorização do servidor como forma de valorizar o serviço público. Aqui em NH temos várias fundações, tem o Instituto de Previdência dos Servidores, temos a Comusa, a Comur. Tenho convicção que o nosso programa de governo é manter essas empresas, fundações, autarquias.
As feridas estão começando a vir à público, que são as Organização da Sociedade Civil (OSC) e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs). Aqui em NH, se não me engano, a saúde pública foi entregue a uma dessas entidades, que são “sem fins lucrativos”. Nos lugares onde isso aconteceu o serviço decaiu. Porque não existe essa coisa de sem fins lucrativos, quando tu entrega um serviço, como é a saúde pública, por exemplo, para ser administrada por uma empresa terceirizada, essa organização precisa tirar do recurso da saúde o seu recurso para se autossustentar, e esse recurso falta lá no atendimento fim. Isso faz com que o serviço decaia. Na minha avaliação é uma forma de privatização que vem acontecendo no serviço público
Tarcísio - Nós não somos do estado mínimo e nem somos dessa basbaquice de choque de gestão. A atual prefeita, que é tucana, vem com esse papo de choque de gestão e está destruindo o serviço público da cidade, e pior de tudo endividando a cidade. Quem tiver que governar NH nos próximos quatro anos vai encontrar uma administração que endividou a cidade, que empobreceu o serviço público, a assistência social. Vamos assumir essa responsabilidade, vamos construir juntos, de forma colaborativa. Construímos um site para abrir espaço para colaboração da comunidade.
Trabalho, geração de renda e transporte
Tarcísio - Hoje não somos mais a capital nacional da produção do calçado, mas somos a capital nacional da tecnologia do calçado. Tivemos uma política muito ativa de apoio a micro e pequenas empresas, programas de crédito muito ativos, de capacitação. Temos aqui uma grande empresa que se chama Fenac, que dinamizamos para que ela seja uma alavanca para o turismo de negócios. Tivemos empenho grande na capacitação tecnológica e em parceira com a nossa universidade, a Feevale, criamos a Hamburg Tec. Com os liberais tomando conta do governo, tudo isso foi desconstruído, descontinuado, e nada foi colocado no lugar.
Vamos retomar essa experiência, dessa articulação com a micro e com a pequena empresa, estimulo a esse segmento. Também teremos um estimulo muito grande para a economia solidária, os empreendimentos solidários.
Sobre o transporte público, precisaremos fazer uma licitação do transporte coletivo. O município precisa de apoio da união e do estado para que possamos ter um novo sistema de transporte público na Brasil inteiro que seja sustentável, de qualidade. Não tem como imaginar uma cidade sem transporte coletivo.
Carla - Eu faço parte do movimento das mulheres e todas essas questões que são relacionadas ao transporte, economia, tudo isso está ligado à situação da mulher aqui na nossa cidade. Nos anos dourados do calçado em NH, na década de 80, início da década de 90, nunca se pensou que o "peão da fábrica", aquele trabalhador, operário, operária, que ele não precisava apenas trabalhar, ele também precisava estudar.
Todas essas questões de educação, trabalho, emprego, renda e violência contra a mulher, elas formam um grande círculo e isso precisa ser enfrentado de uma forma real, concreta. Muitas pessoas estudaram só até a quarta série, isso porque nos anos dourados do calçado, que foram para alguns, não eram anos dourados para todos, algumas pessoas eram apenas mão de obra. Isso é uma questão que precisa ser enfrentada: que tipo de qualificação que as pessoas têm para serem inseridas no mercado de trabalho? É um desafio enorme.
A questão do transporte público, nós andamos na contramão, fizemos um discurso constante sobre o transporte coletivo para preservar o meio ambiente, para melhorar o fluxo na cidade, e na verdade estamos cada vez mais abandonando o transporte público e optando pelo transporte individual. O município não vem fazendo esforço suficiente para resolver isso, as empresas não têm interesse para que a licitação de fato aconteça.
Cultura
Tarcísio - O teatro público está fechado há quatro anos. Vamos retomar um processo de articulação da cultura com a educação. Retomar a possibilidade de acesso à cultura. A cidade de Novo Hamburgo já foi muito atuante neste aspecto, temos uma riqueza cultura muito grande e vamos valorizar a partir de um processo de diálogo e de um acesso mais equânime aos recursos da cultura. Democratizar o acesso é muito importante. A lei Aldir Blanc efetivamente vem em uma hora de transcendental importância porque a atividade cultural foi muito destruída. Quanto ao tema da informação, comunicação, é um compromisso que temos de dar voz a quem não tem voz.
Carla - Nos últimos anos a cultura vem sofrendo tantos ataques. Se considera, muitas vezes, um desperdício de dinheiro público, quando na verdade a cultura promove emprego desde a costureira até o comerciante que vende o material para ser utilizado nos espetáculos, o pessoal que trabalha na montagem de palco. Promover cultura é promover emprego e renda, assim como promover esporte também é promover emprego e renda. A gente precisa cada vez mais ressaltar isso.
Segurança pública e a cidade que queremos
Carla - Precisamos investir muito em segurança pública. E quando eu falo disso não falo só aqui no município. Temos uma guarda municipal altamente qualificada, mas essa segurança pública precisa, de um modo geral, receber mais treinamento. Porque ela não pode ser uma segurança que faça única e exclusivamente repressão às comunidades pobres, às pessoas mais humildes. Tivemos aqui, há cerca de três, quatro anos, uma varredura na cidade de todos os senegaleses que estavam na cidade ganhando a vida. A polícia que nós desejamos é uma polícia que defenda o cidadão e não uma polícia que temos hoje em dia. Tem muita coisa para ser feita, mas temos um material humano muito rico entre essas pessoas, mas a cultura que existe nesse meio precisa ser muito trabalhada.
A cidade que eu quero é uma cidade gigante, do tamanho dos nossos sonhos. Uma cidade para todos e para todas, uma cidade que possamos sonhar um futuro para nossos filhos, uma cidade onde as mulheres possam andar tranquilamente na rua, uma cidade onde a casa das pessoas seja seu lugar de abrigo e não seu lugar de insegurança como é a casa de muitas mulheres. Uma cidade onde a gente possa ter oportunidade de trabalho, de educação. Essa é a cidade que eu sonho.
Tarcísio - A Carla colocou bem o tema da segurança pública. Eu só quero dar um destaque de que quando estivemos no governo, fortalecemos muito a guarda municipal, fizemos uma guarda que tinha compromisso principalmente com a prevenção. Tornamos a cidade mais clara com o programa reluz. Se chegarmos à prefeitura, em dois anos vamos ter um sistema de iluminação pública à base de led instalado, uma cidade mais iluminada.
Quanto à cidade que quero, é uma cidade mais humana, que possam ser solidárias, uma cidade que tenha em sua plenitude aquilo que o frei Leonardo Boff chama de vida em abundância, uma vida efetivamente compartilhada, uma vida vivida juntos e convivida entre todos. E imediatamente uma vida sem covid, uma cidade que não deixa a fome atingir as pessoas, eu quero uma cidade que volte a acreditar na possibilidade de trabalho e renda para todos.
Assista a entrevista completa na Rede Soberania
Edição: Marcelo Ferreira