O artista plástico brasileiro Márcio Machado, que vive em Paris desde 1972, criou a escultura de um trono totalmente construído com ossos e denominado por ele “O Trono Obsceno e Mórbido da Dinastia Bolsonaro”. A obra critica a postura do presidente brasileiro Jair Bolsonaro diante da pandemia do novo coronavírus.
O mandatário adotou atitudes anticientíficas que contribuíram para que o país seja o segundo mais atingido no mundo pela covid-19 em números absolutos, atrás apenas dos Estados Unidos, cujo presidente, Donald Trump, tem em Bolsonaro um aliado. O Brasil chega ao mês de setembro somando mais de 121 mil mortos e rondando os 4 milhões de contaminados confirmados.
O trono que o gaúcho Márcio Machado vai expor na Praça Saint-Michel é composto por tíbias e omoplatas de boi. Sua visualização causa impacto não só pelo inusitado do suporte, como também pelo tamanho de 2 metros de altura e pelo resultado estético. As articulações são folheadas a ouro.
“O trono é um símbolo representativo do poder político e, feito com ossos, evoca a morte”, diz o artista, que também mostrará na praça uma tela pintada a partir da escultura do trono. Sempre que produz uma escultura, ele a retrata em tela, e vice-versa. Márcio tem no currículo a distinção de ter sido o primeiro brasileiro convidado a expor uma obra de arte no Centro Beaubourg-Georges Pompidou, em 1977.
A denominação “O Trono Obsceno e Mórbido da Dinastia Bolsonaro” alude ao presidente e seus três filhos políticos, o senador Flávio (investigado pela prática de “rachadinha”), o deputado federal Eduardo (investigado por fake news) e o vereador Carlos (investigado por “rachadinha” e fake news).
Escultor e pintor, Márcio vai ampliar ainda mais seu protesto na praça por meio de um caixão de defunto que decorou com uma "parafernália" de acessórios dourados e que reforça a reprovação do morticínio causado pela má gestão da covid-19 no Brasil. “Estou apresentando a série Obras Engajadas e Recentes a convite da Fundação Julieta Vargas de Lima, de Paris, São Paulo e New York, sendo que mostras na capital paulista e na cidade norte-americana estão em discussão”, diz ele.
Impeachment
Márcio está mobilizando a comunidade brasileira residente na capital francesa para os três dias do Manifesto contra a Dinastia Bolsonaro: sábado (5), domingo (6) e segunda, o 7 de Setembro, data da Independência do Brasil. Nos três dias, serão coletadas assinaturas em favor do impeachment de Bolsonaro. No dia 7, em razão da efeméride nacional, o protesto também abrirá espaço para a celebração ao melhor estilo brasileiro, com música e dança e a reivindicação de uma “nova e verdadeira independência, sem submissão aos Estados Unidos de Donald Trump”, defende Márcio.
O artista destaca que no início da crise sanitária, Bolsonaro classificou o coronavírus de “gripezinha”, depois não respeitou o distanciamento social e o uso de máscara e propagandeou o uso da hidroxicloroquina - droga sem comprovação científica -, além de ter exonerado dois médicos do cargo de ministro da Saúde e colocado na vaga um general sem especialização, entre outros equívocos apontados por seus críticos. "No campo político, o presidente apoiou atos públicos antidemocráticos a favor do fechamento dos poderes Legislativo e Judiciário, é hostil ao trabalho da imprensa e despreza a cultura e as artes."
Amazônia e índios dizimados
Na opinião de Márcio, a situação do país “é surreal". Afora a pandemia, “a Amazônia queima por todos os lados e os índios são dizimados no mapa do genocídio, ao mesmo tempo que a população é reduzida ao simples papel estatístico de velhos, pobres e negros, isso tudo em um ambiente de desprezo à Constituição”. Para o artista, os filhos de Bolsonaro “brincam de presidente, dão instruções absurdas e alimentam mentiras, fake news, com os ministros militares às suas ordens e submissos”.
Vida e carreira
Márcio trocou o Brasil pela França em meio ao regime militar que vigorou em seu país de origem durante 21 anos (1964/1985). Ele emigrou junto com um grupo de amigos, entre eles o jornalista e escritor Caio Fernando Abreu (1948/1996).
O artista manteve-se informado sobre a política nacional. Suas preocupações quanto à estabilidade democrática aumentaram a partir da eleição de Bolsonaro, que tomou posse em janeiro do ano passado. O risco de retrocesso institucional no Brasil tornou-se uma séria possibilidade, embora a maioria da população preze a democracia.
Paralelamente às artes plásticas, Márcio Machado trilhou carreira também nas artes dramáticas, iniciada em Porto Alegre, no então Centro de Artes Dramáticas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) e desenvolvida em Paris como produtor, diretor, ator e formador de atores.
Durante 15 anos, ele manteve em Paris a sua própria escola de arte dramática, na qual recebia alunos locais e de outros países, como Estados Unidos e Japão. Como convidado, ministrou master classes na conceituada Unirio, no Rio de Janeiro, por exemplo.
Edição: Katia Marko