A prefeitura municipal de Erechim, município da região Norte do Rio Grande do Sul, retomou o processo de privatização do saneamento básico em plena pandemia do novo coronavírus. Nesta sexta-feira (7), ocorre uma audiência pública virtual para apresentação do edital de concessão dos serviços de água e esgoto.
Para o Fórum Popular em Defesa da Água de Erechim, o debate no formato virtual é uma manobra para impedir o amplo debate e plena participação popular nas decisões. O movimento contrário à privatização considera um descaso a entrega à iniciativa privada desse serviço essencial para a sociedade, cotado em um valor de 2,4 bilhões de reais, "que sairão do bolso dos erechinenses ao longo de 30 anos".
“A prefeitura quer acelerar esse processo, retomando os trâmites para privatização em plena pandemia e no final da gestão da atual administração municipal, de Luiz Francisco Schmidt (PSDB)”, afirma a integrante do Fórum Grasiele Berticelli. Para ela, a iniciativa segue a política do governo federal, que abriu as portas para a privatização em massa com a aprovação do novo marco regulatório do saneamento.
“O novo marco promete a universalização em 13 anos, pelo investimento privado, com aporte de bancos públicos, como o BNDES, que vai ficar nas mãos das multinacionais. A iniciativa privada visa apenas o lucro, e a negociação é muito mais difícil. Exemplo disso é o setor elétrico, no qual a privatização ocorreu nos anos 90, e pagamos umas das 5 tarifas de energia mais caras do mundo, produzindo uma das energias mais baratas, de fonte hídrica”, afirma.
Tarifa mais cara e queda de qualidade
Entre as consequências da privatização apontadas pelo Fórum estão o aumento do preço da tarifa e a piora na qualidade dos serviços prestados. “As contas passarão a sofrer três tipos de reajuste, o anual, a revisão tarifária e a revisão extraordinária”, afirma. Além disso, destaca que outros custos entrarão na tarifa, entre eles a previsão de que a empresa vencedora faça mais de R$ 300 milhões em investimentos e o pagamento de R$ 30 milhões a título de outorga; uma indenização de R$ 62 milhões pela patrimônio físico da Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN) no município, caso esta não seja a vencedora do edital; e o pagamento da taxa de coleta e tratamento de esgoto, que custa em torno de 70 a 80% do valor do m³ de consumo de água.
Para se posicionar durante a audiência pública chamada pela prefeitura de Erechim, as pessoas deverão enviar seus questionamentos com antecedência para a prefeitura via e-mail. Grasiele lembra que apenas uma pequena parcela da sociedade tem acesso à internet de qualidade, a aparelhos como celular e computador e até mesmo a uma conta de e-mail, para possibilitar a plena participação na audiência.
Defesa do saneamento
O Fórum Popular em Defesa da Água convoca toda a população do Alto Uruguai a se posicionar contra a realização da audiência e “passar por baixo dos panos uma discussão que diz respeito a toda a população, que será diretamente afetada pelos impactos da privatização do saneamento”.
A história da luta em defesa da água em Erechim remonta ao ano de 2010, na ocasião da primeira tentativa de privatização. Desde 2008, quando o contrato da prefeitura com a CORSAN acabou, a prefeitura não quis renovar, na intenção de privatizar. Foi na época da primeira tentativa de privatização que iniciaram as articulações entre movimentos, sindicatos, setores da igreja, alguns políticos, professores, estudantes e o povo em geral, que resultaram na criação do Fórum Popular em Defesa da Água.
Desde então, muitas tentativas de privatização se sucederam, impedidas pela organização popular. Recentemente, no dia 26 de junho, a prefeitura anunciou uma audiência pública que se daria de forma presencial e on-line, a qual foi suspensa por uma decisão judicial liminar, devido aos riscos de promover aglomeração em plena pandemia. Assim, a prefeitura está utilizando da estratégia de realizar a formalidade de maneira 100% virtual, desconsiderando o direito do povo de participar e decidir sobre os rumos do saneamento em Erechim.
Campanha nas redes
Conforme explica Grasiele, o Fórum tem feito debates junto da sociedade, alertando sobre a importância do acesso à água e saneamento serem de fato tratados como direitos básicos e não como mercadorias, e alertando para os riscos da privatização, como observado em Uruguaiana, Novo Hamburgo, Manaus, Teresina, Chile.
“Neste momento de pandemia, em que não podemos ir para a rua, conversar com o povo frente a frente, fazer panfletagem, etc..., o Fórum vem intensificando a campanha contra a privatização nas redes”, afirma Grasiele. A campanha provoca as pessoas e entidades a manifestarem apoio à luta por meio de fotos segurando cartazes e placas em defesa do saneamento público, que foram publicadas no evento da campanha e página do Fórum no Facebook. Além das iniciativas de comunicação, estão sendo feitas movimentações jurídicas para suspensão da audiência do dia 7, “a partir do argumento de que não garante a participação popular”, conclui.
Edição: Marcelo Ferreira