Na última terça-feira (21), o Ministério da Saúde interrompeu o financiamento da pesquisa Epicovid, coordenada pelo Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que tinha como objetivo estudar a prevalência de coronavírus no Brasil. Para o reitor da universidade, o epidemiologista Pedro Hallal, a decisão não foi técnica, mas política. Frente a isso, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) reuniu-se virtualmente, nesta quarta-feira (22), com o reitor para reforçar o apoio à continuidade da pesquisa.
Considerada o maior estudo epidemiológico que se tem conhecimento sobre a covid-19 em todo o mundo, a pesquisa Evolução da Prevalência de Infecção por Covid-19 no Brasil (Epicovid19-BR) foi financiada pelo Ministério da Saúde e aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do CNS. Após concluir as três fases previstas no cronograma original, a pesquisa foi encerrada e, no momento, aguarda novos investimentos para prosseguir com os testes e entrevistas.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, de Porto Alegre, Hallal, destacou ser uma uma decisão totalmente política. “Tecnicamente, os artigos decorrentes desta pesquisa estão sendo publicados nas revistas de maior referência no mundo. A nossa pesquisa mostrou que nos indígenas o risco de contaminação é cinco vezes maior. Entre os pobres é o dobro do risco. Ou seja, as populações mais vulneráveis, que deviam estar sendo protegidas, não estão sendo protegidas”, expôs.
Diante da repercussão do cancelamento na mídia, o CNS ressaltou que os dados brasileiros têm sido essenciais para a compreensão da epidemiologia da pandemia, não só no país, como no cenário internacional. “O Conselho já se solidarizou em outros momentos quando houve agressão e ataques de investimentos à ciência. Acreditamos que seja fundamental a continuidade destes estudos para o enfrentamento da pandemia no nosso país”, afirma o presidente do CNS, Fernando Pigatto.
“Concluímos com sucesso as três fases da pesquisa e esperamos que ela prossiga, porque a pandemia está seguindo e a população brasileira precisa desses dados. Como epidemiologistas queremos seguir produzindo informações epidemiológicas para que Brasil continue enfrentando a Covid-19", reiterou o reitor Hallal.
Em nota divulgada pela imprensa, o Ministério da Saúde disse que "dará continuidade a estudos de inquérito epidemiológico de prevalência de soropositividade na população". A pasta disse que ainda não está definido se será a continuação do EPICOVID19-BR, pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) ou por outra instituição, ou PNAD Covid, pelo IBGE. Uma alternativa em estudo é utilizar ambas as estratégias.
A UFPel busca agora novas formas de financiamento para dar sequência às próximas fases da Epicovid. Segundo o reitor, já existem negociações com instituições de pesquisa e iniciativa privada, para evitar que o estudo seja afetado.
A pesquisa
O estudo foi realizado em 133 cidades brasileiras, consideradas as mais populosas conforme divisão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre outros aspectos, o estudo aponta as diferenças na evolução do coronavírus entre as regiões do Brasil e confirma que o risco de infecção não depende da idade, ou seja, adultos e crianças correm os mesmos riscos de contaminação.
O levantamento também mostra que há seis vezes mais pessoas com anticorpos para a covid-19 do que as estatísticas oficiais apontam e que apenas 9% dos pesquisados não relataram qualquer sintoma, ou seja, a maioria dos casos não são de pessoas assintomáticas.
A pesquisa aborda as desigualdades regionais, as diferenças por nível sócio econômico e etnia, o grau de adesão da população brasileira às recomendações de distanciamento social, como esse percentual muda ao longo do tempo e a velocidade de expansão do coronavírus, entre outros aspectos.
A primeira fase foi feita entre os dias 14 e 21 de maio, totalizando 25.025 entrevistas e testes. A segunda fase realizou-se entre os dias 4 e 7 de junho, tendo sido conduzidas 31.165 entrevistas e testes. A terceira fase ocorreu entre os dias 21 e 24 de junho, totalizando 33.207 entrevistas e testes.
Somando as três fases da pesquisa, trata-se do estudo epidemiológico com maior número de indivíduos testados do mundo para o coronavírus, com uma amostra total de 89.397 pessoas entrevistadas e testadas.
Iniciativas similares estão sendo realizadas nos Estados Unidos, Espanha, Islândia, Áustria e Suécia.
Confira os resultados da pesquisa
*Com informações da Ascom CNS
Edição: Marcelo Ferreira