Apesar da frente fria que chegou esta manhã ao Rio Grande do Sul com chuvas e temperaturas abaixo de dez graus que pode dispersar a nuvem de gafanhotos que se encontrava na província de Corrientes, Argentina, a 130 quilômetros da fronteira brasileira, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) publicou no Diário Oficial da União (DOU) uma portaria declarando estado de emergência fitossanitária nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Desta forma até junho do próximo ano poderá ser comercializado sem licença especial e sem licitação qualquer tipo de venenos para o combate de insetos, que deixaram de ser uma ameaça. As empresas de aviação agrícola colocaram à disposição dos governos estaduais e federal, 426 aviões agrícola para a pulverização de inseticidas que permanecem de prontidão. “A aviação agrícola é considerada mundialmente uma das principais armas no combate a nuvens de gafanhotos”, disse em nota o diretor-executivo do Sindicato da Aviação Agrícola (Sindag), Gabriel Colle.
A Somar Meteorologia explicou que a ameaça está ficando cada vez mais distante porque os insetos preferem tempos secos e quentes, e com a previsão de chuva entre esta quarta e quinta-feira, eles não devem chegar em grande número ao estado. "Se permanecêssemos com ventos de norte e tempo seco por mais dias, poderia chegar."
O ministro da Agricultura do Uruguai, Carlos Uriarte, disse ao site “Subrayado”, que o país está alerta e o tamanho da nuvem de gafanhotos é de dez quilômetros de extensão por três quilômetros de largura, e pediu aos agricultores do país que avisem imediatamente as autoridades se notarem a aproximação dos insetos. Ele pediu que não fossem usados pesticidas e alertou que produtos químicos não permitidos no Uruguai que estavam sendo usados na Argentina porque podem matar as abelhas. "A probabilidade de chegar (ao país) existe, mas devido às previsões que administramos de onde serão os ventos, geadas e frios anunciados além das chuvas, consideramos que, embora haja possibilidades, é improvável que chegue na mesma dimensão que é na Argentina", afirmou Uriarte.
Venenos provocam desequilíbrios ambientais
O integrante da Associação Brasileira de Agroecologia Leonardo Melgarejo, por sua vez, afirmou que o governo deveria utilizar este dinheiro para apoiar medidas de controle e ressarcimento aos prejudicados, nos locais afetados. “O inseticida vai ampliar os problemas e beneficiar vendedores de veneno.” Segundo ele, todos esses químicos alteram relações simbióticas, provocam desequilíbrios ambientais. “Matam ou alteram comportamentos e metabolismos de plantas, fungos, bactérias e animais. Geram desequilíbrios com várias implicações.” Ele acrescentou que a nuvem, se chegar, pode pelar o campo onde aterrissar. “A alimentação dos animais, naquele ambiente, ficará super prejudicada. Mas se jogarem veneno de avião, será pior. Daí vão morrer também todos os pássaros, pequenos mamíferos, sapos lagartos e peixes que comerem gafanhotos envenenados.”
O professor de biologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Valério Pillar confirmou que “a proposta de usar pulverização aérea de inseticidas é absurda pelo risco de contaminação em geral e eliminação de organismos não alvo”.
Melgarejo explicou ainda que a prevenção exige conhecimento a respeito do comportamento dos insetos. O que forma uma superpopulação? Obviamente são as condições favoráveis à multiplicação. Os gafanhotos seguem o padrão de todos os seres vivos: em condições ótimas de temperatura e umidade, o que inclui alimentação abundante, se multiplicam. Se não houver controle para a superpopulação, ela decai naturalmente, ou migra. Os animais e insetos com esta capacidade, sempre fazem isso. Então, se não dominamos a temperatura e a umidade, restam as outras formas de controle e prevenção. Os naturais, pelos pássaros pequenos animais, aranhas e outros insetos.
"Esmagar, queimar e envenenar são os piores métodos"
“Podemos catar com a mão, e comer, é ótima proteína, muitos povos fazem isso. A FAO recomenda. Podemos esmagar, queimar, envenenar. E estes últimos são os piores e mais estúpidos dentre os métodos de controle. Também podemos, no manejo desta onda, dependendo das condições de temperatura e umidade, contribuir para retardar ou acelerar a próxima crise.” Neste caso haveria que avaliar sua condição natural. Em que estágio do ciclo de vida eles estão? Quanto tempo mais a grande maioria vai viver? Até onde podem ir, viajando nesta velocidade? Respostas deste tipo ajudarão a entender o problema e devem antecipar as decisões. Dependendo das respostas, comprar veneno, tende a ser a pior decisão.
Segundo Melgarejo, os gafanhotos são polífagos. Comem de tudo que é verde. Onde a nuvem baixar, a perda será total. “Penso que isto deva ser encarado como um problema social, coletivo. O Estado deve assumir estas perdas, que acontecerão em algum local.” Por outro lado, afirma ele, onde eles descerem haverá alimento de sobra para outros organismos, que estarão esperando. E os gafanhotos também podem fazer oviposição naquele local. Quando eclodirem, haverá novo estrago na vegetação e nova festa dos pássaros. Dependendo das condições de temperatura, umidade, predação dos insetos jovens, pode no futuro surgir ali outra revoada. Portanto, se trata de questão de interesse coletivo. “A raiz disso é o desequilíbrio ecológico que favorece esta grande população de insetos e está associada ao sumiço dos controles naturais, dos pássaros, dos pequenos roedores, associados a mudança climática que nos dá uma sequência de verão e outono secos, e inverno cada vez menos frio que seria o período de controle”, concluiu o ambientalista.
Edição: Katia Marko