Caso é igual mas agora ganha pouquíssimo espaço, quase clandestino na RBS e na grande mídia estadual
Em 1999 a Ford resolve não se instalar mais do Rio Grande do Sul. Olívio Dutra, então governador, foi acusado pela RBS, pela mídia e por toda a corja de “mandar a Ford embora”. Isso depois da empresa ter tomado muito dinheiro a fundo perdido do Governo do Estado. Era um grande embuste por que se tratava na verdade de um embate ideológico. Olívio Dutra defendia que o Estado não deveria dar mais benefícios fiscais para quem já tinha ganho um monte de dinheiro público. Mesmo assim, a mídia capitaneada pela RBS passou a espancar Olívio Dutra diuturnamente, o que o levou a ser derrotado na eleição seguinte.
Mas foi tão grande a farsa que 11 anos depois, a Zero Hora, em 2016, teve que publicar uma outra matéria (Esta deste link: Ford aceita pagar R$ 216 milhões de indenização ao RS e encerra briga judicial de 16 anos). Sartori, o governador de plantão da RBS, tinha topado negociar pela metade do valor que o Estado havia processado a Ford por ter saído sem dizer por que. Mais dois anos se passam e, em 2018, 16 anos depois, Zero Hora publica página inteira de reparação a Honra de Olívio Dutra, depois de tardia decisão judicial.
Agora, algo semelhante acontece com a gigante do e-commerce, o Mercado Livre. Com pavilhões e estrutura já erguidos, provavelmente com recursos públicos ou de bancos estatais, eis que a megaempresa decide que vai embora.
E de novo a gente lembra daquela feita onde a RBS e a mídia guasca passaram a bater diuturnamente em Olívio, com a anuência do Judiciário, que demorou quase duas décadas pra reparar o estrago, garantir ao Estado a indenização e ao Olívio a reparação muito tardia da honra.
O caso é igual. Mas agora ganha pouquíssimo espaço, quase clandestino na RBS, na Zero Hora, e na grande mídia estadual. O governador Eduardo Leite (PSDB), que disse “que não sabia de nada”, ganha metade do espaço para se defender, coisa que ao Olívio só foi garantido 18 anos depois, pela Justiça.
Segue artigo do Jornal do Comércio sobre a saída do Mercado Livre daqui, deixando pra trás um pavilhão e contas pro Estado e o Município de Gravataí pagarem:
Mercado Livre desiste de abrir centro de distribuição em Gravataí que geraria 500 empregos
O Mercado Livre, gigante de e-commerce, não vai mais se instalar em Gravataí, na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA). A confirmação foi nesta sexta-feira (19). Em fim de fevereiro, a empresa argentina havia decidido segurar os planos, devido a uma negociação em andamento com o governo estadual na área tributária. O centro de distribuição abriria 500 empregos. A decisão ocorre em meio à pandemia do novo coronavírus, que alavancou as vendas em canais digitais devido ao distanciamento social.
A desistência na instalação da operação, que seria às margens da RS-118, gerou grande frustração no município. Quando houve o comunicado em fevereiro, a Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz) disse ter sido surpreendida, pois estava em tratativas.
"De Brasília, o executivo da empresa Mercado Livre me ligou para comunicar que Gravataí perdera, definitivamente, em virtude da falta de apoio do governo do Estado, o empreendimento anunciado há quase um ano", lamentou o prefeito Marco Alba. "Foi com tristeza que recebi o telefonema cordial e atencioso, mas cujo conteúdo foi muito amargo para Gravataí", completa Alba.
"Infelizmente, as negociações com o governo gaúcho para desburocratizar a atuação de vendedores de fora do Rio Grande do Sul dentro do Estado resultaram infrutíferas até o momento", alegou a companhia, que informou que "mantemos nosso propósito de instalar um CD no Sul do Brasil, por ser um importante mercado para nossos usuários, tanto vendedores quanto compradores da plataforma".
A Mercado Livre avisa que já está conversando com localidades na região (Santa Catarina e Paraná), "onde identificamos um modelo de atuação mais favorável aos empreendedores que atuam em nosso marketplace".
A empresa apontou que o motivo do recuo seria o fracasso das conversações com a Sefaz. A empresa buscava uma condição tributária especial para o trânsito de mercadorias que vêm de outros estados para serem entregues a clientes no Rio Grande do Sul.
O pleito era de que as empresas que usam o marketplace não teriam de ter registro com CNPJ na Fazenda gaúcha já que a venda ocorre pelo e-commerce. O CD seria um entreposto de chegada e saída de encomendas. A exigência de que seria necessário ter a inscrição estadual seguiria regras do ICMS, com emissão de nota fiscal, explicou a Fazenda. As conversas buscavam criar uma condição especial, seguindo uma medida adotada em São Paulo.
O governador do Estado, Eduardo Leite, usou seu perfil no Twitter para dizer que não foi informado oficialmente sobre a "suposta desistência definitiva da empresa Mercado Livre de instalar um centro de distribuição (CD) em Gravataí, na região metropolitana".
Estado vai levar tema ao Confaz, e Gravataí cobra Leite
Em nota, a Sefaz informa que ofereceu "uma harmonização da legislação tributária do RS com a de São Paulo para que fosse possível a instalação do CD nas mesmas regras de outros centros de distribuição", assegurou o órgão. A secretaria diz que "permanece tentando superar questões adicionais ao modelo paulista em vigor" e que vai levar o assunto ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para as operações de Fulfillment (logística de e-commerce).
Apesar da Mercado Livre indicar que já busca novo destino, o governo gaúcho garante que faz esforços "para garantir o investimento e busca o melhor entendimento para que a instalação do CD seja positiva para o Estado e para a própria companhia". Mas a Sefaz condiciona ao respeito de "aspectos comerciais da economia como um todo".
Alba diz que recebeu a informação passada de que a empresa deve se instalar em Santa Catarina e que um dos motivos seria a agilidade para oferecer as condições para o modelo de venda da empresa. A notícia foi dada pelo site NSC Total.
O primeiro alerta de mudança de planos ocorreu um dia antes da gigante de marketplace retirar o alvará para funcionar. O motivo alegado foi a indefinição nas conversas com a Fazenda. "À época, considerava-se que tal solução seria possível e rápida, já que a geração de empregos e renda era – como deve ser – bandeira política do governador", citou o prefeito.
"Entre o discurso e a prática existe mesmo um abismo. E este abismo só se transpõe com foco e inovação, o que não se viu no Governo do RS no episódio da Mercado Livre", critica o gestor. Alba avalia que "o governo gaúcho limitou-se a repetir a cartilha e reproduzir a interpretação de São Paulo (coincidência?), ao não acolher os argumentos da empresa e se recusar a modernizar sua legislação tributária".
"Nem se tratava de renunciar a impostos, mas de mudar o momento da tributação. Entretanto, a Secretaria de Estado da Fazenda não alcançou a importância do empreendimento e o expeliu para Santa Catarina. Nossos vizinhos acima do Rio Mampituba agradecem, pois sua população terá empregos e o Estado, mais riqueza, enquanto aqui, no Rio Grande, seguimos com belos discursos, mas poucas práticas. Parole, parole, parole", finalizou o prefeito.
Edição: Marcelo Ferreira