Nesses tempos orquestrados pela pandemia e pelo grande capital financeiro, a pulverização de seus fetichismos se propaga em todos os espaços da vida social. Vivemos um profundo desmonte das conquistas civilizatórias dos(as) trabalhadores(as), onde o perverso sistema que coloca como principal a hegemonia do capital que rende juros – denominado por Marx de capital fetiche –obscurece a vida do povo que está sem comida, sem emprego, sem renda, sem condições básicas de sobreviver a está crise econômica, sanitária, política e civilizatória.
A lógica do sistema capitalista está polarizando dois campos antagônicos: um que defende a vida, representado pelas orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), a exemplo do que fez a China no combate à covid–19; outro que coloca o capital financeiro, o mercado como um fim maior da sociedade.
Vivemos um tempo do conflito entre a ciência e o obscurantismo, mas na verdade, o que está em jogo é a vida de todos e todas nós.
Os(as) mais atingidos(as) pela pandemia são os trabalhadores e trabalhadoras, os mais pobres e sobretudo negros e negras. A covid–19 trouxe a nú a realidade da desigualdade social do nosso país.
O povo brasileiro vem enfrentando os reflexos pós golpe 2016, e a EC95 foi uma das grandes responsáveis, já que congelou o orçamento do governo Federal por 20 anos, sentenciando a precarização do SUS e de todas as políticas sociais. Mesmo assim, é o Sistema Único de Saúde quem dá conta da crise sanitária.
Ainda bem que o SUS existe, agradecemos aos lutadores e lutadoras, aos democratas que tem resistido em sua defesa. Por que do contrário disso os corpos estariam se acumulando nas ruas.
Não há como estados e municípios sobreviverem sem que sejam socorridos pela união; não há como as pessoas sobreviverem sem que sejam socorridas pelo poder público. Não há como combater a covid-19 sem as políticas públicas, políticas de Estado.
A conduta genocida do presidente Bolsonaro que tem promovido a elevação do número de pessoas infectadas; o que vai causar, infelizmente, muita morte é ainda mais inclemente ao tentar impor sistemático corte aos direitos trabalhistas, a exemplo da MP 905, do discurso contra o Estado democrático de direito – essa é a agenda neoliberal que produz miséria e morte por todo o mundo por onde é praticada.
Em oposição ao neoliberalismo fazemos a defesa da vida, da saúde das pessoas, do emprego e do salário, do isolamento social. E, nesse sentido é necessário incrementar as políticas públicas.
O Senado aprovou e já foi sancionada no dia 7 de abril a Lei nº 13.987, que altera a Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009, marco legal do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), para autorizar, em caráter excepcional, durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica. O PNAE é um programa de Estado e de garantia de direitos. Tem por diretriz a universalidade, atende a todos(as) os(as) estudantes da rede pública da educação básica.
Com a Lei nº 13.987 fica garantido, mesmo neste momento de suspensão de aulas, o direito à alimentação neste momento excepcional; sob acompanhamento do Conselho da Alimentação Escolar (CAE). A distribuição aos pais/mães ou responsáveis deve ser imediata. Estamos falando de um universo de 52 mil estudantes em Porto Alegre, o que corresponde a 1 milhão de reais que não está sendo utilizado. Essa atitude do prefeito Marchezan é perversa, pois quem tem fome tem pressa.
A logística da distribuição dos kits ou quentinhas deve ser feita a critério da administração municipal, pela Secretaria de Educação (SMED), que acompanhado da equipe responsável pela alimentação deve traçar estratégias que evitem aglomerações de pessoas e sigam as recomendações conforme a Resolução RDC nº 216 de 2004, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA.
O prefeito Nelson Marchezan Júnior e o secretário Adriano Naves de Brito, além de garantir a alimentação aos/as estudantes da rede municipal no período de suspensão das aulas, devem seguir o que determina o art.14 da Lei 11.947/2009 em relação à aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar. Qual seja, do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas.
Essa composição obrigatória da merenda escolar assegura aos(as) estudantes um reforço no sentido da segurança alimentar, necessária ao enfrentamento da pandemia e também alimenta a cadeia de emprego e renda para centenas de famílias do meio rural em Porto Alegre e região metropolitana – o que se pensa como indispensável nesse momento de combate à covid-19.
A prefeitura poderá optar pela distribuição dos alimentos aos equipamentos públicos, tais como cozinhas comunitárias, restaurantes populares, Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), é sua responsabilidade criar protocolos de distribuição que podem ser acordados entre a equipe da rede socioassistencial e a SMED, mas é sua obrigação fazê-lo.
O governo Marchezan não definiu os protocolos de distribuição da verba do PNAE, não pensou em alternativas para incrementar esse montante (1 milhão), mas poderia. O município poderia agregar a esse valor sua contrapartida, nos moldes da excepcionalidade da verba do PNAE, dando maior robustez ao montante total do valor destinado aos kits de alimentação/quentinha que devem ser distribuído aos(as) alunos(as) da rede pública municipal.
Essa não é uma escolha do prefeito, é um direito de cada aluno e aluna porque a merenda escolar é uma política de Estado, porque estamos sobrevivendo em meio a uma pandemia, porque quem tem fome tem pressa.
É hora de unidade, solidariedade e defesa da vida. Precisamos cobrar do presidente, do governador e do prefeito Marchezan atitudes emergenciais. Está em risco o presente e o futuro, a vida de mulheres e homens que neste momento estão em isolamento social passando fome, ou estão nos seus postos de trabalho sem equipamentos de proteção individual (EPIs).
Não vamos nos calar! Seguiremos cobrando dos governos ações que de fato garantam a vida do povo brasileiro. Somente ações paliativas são insuficientes para o momento dramático que vivemos.
Enquanto eles gritam morte, nós gritamos vida. Enquanto eles gritam ódio, a gente grita amor.
Assuma sua responsabilidade secretário Adriano e Marchezan!
Cadê o dinheiro da merenda escolar Prefeito?
(*) Silvana Conti é professora aposentada da Rede Municipal de Ensino (RME) de Porto Alegre, vice-presidenta da CTB. Fabiane Pavani é professora da RME e conselheira do CME.
Edição: Sul 21