Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | É preciso por fim a este desgoverno irresponsável!

Para Mauri, governo aposta no caos e na polarização, único combustível capaz de mantê-lo com alguma viabilidade política

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Para Cruz, Bolsonaro "é incapaz de liderar o Brasil na superação da pandemia e da crise econômica" - Reprodução

Mesmo depois do pronunciamento desastroso em cadeia nacional que sofreu críticas de todos os setores políticos, sociais e econômicos do país, Bolsonaro mantém sua postura irresponsável e radicaliza visando mobilizar sua base contra as orientações da OMS e do Ministério e do Conselho Nacional de Saúde. Com esta atitude, deixa explícita a intenção de sacrificar milhares de vidas para garantir sua própria sobrevivência política.

Para viabilizar esta estratégia, articula parte da elite econômica que vive no Brasil (não são dignos de serem chamados de brasileiros já que adoram a bandeira norte-americana e os valores desta pátria estrangeira) para pressionar a saída do Ministro da Saúde, deslegitimar os governadores e os prefeitos visando por fim ao isolamento social, medida que, junto com os testes em massa, são capazes de tornar a pandemia menos gravosa para a população brasileira. Joga todas as fichas contra o isolamento social, chamando carreatas e atos públicos, apostando no caos e na manutenção da polarização social, único combustível capaz de mantê-lo com alguma viabilidade política.

Este comportamento, notadamente esquizofrênico, aposta na criação de inimigos comuns – o SUS, os parlamentares, a mídia, os prefeitos e governadores – fato psicológico essencial para reaglutinar seus seguidores em torno de suas ideias. A questão é que, provavelmente, Bolsonaro e seu clã não tenham outra saída senão radicalizar. Seu governo está na berlinda porque não demonstrou nenhuma capacidade de enfrentar a crise sanitária e a profunda crise econômica que já estava anunciada e foi agravada com a pandemia.

Perde apoio social, inclusive, de parte da direita que o elegeu, de importantes setores empresariais, da parcela da mídia que ainda lhe dava sustentação e de importantes setores dos militares, da marinha e da aeronáutica. Este desgoverno irá custar milhares de vida de brasileiros e brasileiras se não for encerrado imediatamente.

Mas nem tudo são mazelas. Na contramão de Bolsonaro está o bom senso da maioria das autoridades públicas brasileiras. Agindo de forma responsável e seguindo os conselhos da comunidade científica internacional, que vem enfrentando o novo coronavírus há quatro meses em outros países, líderes do Congresso, governadores e prefeitos não estão se deixando levar pela histeria do Presidente. Buscam criar as condições concretas para que o Brasil sobreviva com o mínimo de mortes possíveis. Mantém as medidas necessárias, como o isolamento social voluntário ou compulsório, a divulgação das medidas de higiene pessoal rigorosa, o reforço às redes de proteção e de atenção a saúde com recursos humanos, equipamentos e financeiros, medidas de socorro financeiro emergencial às pessoas vulneráveis e sem condições econômicas para suportar o isolamento, apoio às iniciativas sociais de solidariedade, implementação de mecanismos permanentes de informação sobre a progressão da pandemia. Para isso, aprovam o estado de emergência, flexibilizam os orçamentos, apoiam medidas de apoio emergencial as classes sociais mais vulneráveis, buscam evitar o pânico e a medo, demonstrando que o país está unido contra um inimigo comum, a covid-19.

As organizações da sociedade civil e os movimentos sociais também assumiram seu papel. Estando diretamente ligados às periferias das cidades, aos povos das florestas, às comunidades rurais e aos segmentos mais vulneráveis da sociedade, rapidamente articularam redes de apoio, proteção, solidariedade e de ações emergenciais. Aqui no Rio Grande do Sul criamos o Comitê Popular em Defesa do Povo e contra o coronavírus. Em âmbito nacional criamos a Rede Solidária, articulando milhares de iniciativas em todo Brasil. Com isso, milhares de fundos de ajuda, ações de mobilização de voluntários, de distribuição de cestas básicas, de distribuição de marmitas, de água e de produtos de limpeza e de higiene pessoal estão sendo realizadas em todo o território nacional demonstrando que estamos unidos contra esta pandemia. 

Da mesma forma, através das redes e plataformas, como a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, Plataforma MROSC (Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil) e Pacto pela Democracia, seguimos cobrando e mantemos pressão sobre os governos e parlamentos, pressionando para aprovação de medidas de saúde e proteção dos setores sociais, políticas de renda mínima, respeito aos direitos humanos, combate à violência doméstica e reforço a todas as políticas sociais.

Aliás, a pandemia provocou uma inimaginável unidade nacional, com milhares de iniciativas solidárias, preocupações com a preservação da vida, não só dos idosos, mas de todas as pessoas, independente de sua classe social. Parte importante do empresariado brasileiro – esse sim, chamado de brasileiro porque se preocupam com o futuro do seu povo – se colocam com empatia e solidariedade neste momento de crise nacional. A consciência é de que não há saídas para uma parte dos brasileiros e brasileiras. Enquanto um segmento estiver vulnerável ao vírus, toda sociedade estará.

O coronavírus põe em xeque a (in)capacidade da liberdade de mercado como forma de resolver os problemas coletivos da humanidade. Prova disto é que, com a pandemia da covid-19, assim como em 2008 na crise econômica dos EUA, os principais líderes do neoliberalismo mundial apelam por medidas urgentes dos estados, reivindicam recursos públicos e politicas de proteção à economia nacional. Quem diria que um vírus seria capaz de tirar a máscara e mostrar a verdadeira face do neoliberalismo, principal causa das crises ambientais, sanitárias, sociais e econômicas.

Esta nova onda, com ênfase no social, recupera a importância da manutenção dos estados nacionais democráticos, com políticas de Estado, com sistemas públicos de Saúde, como o SUS, mecanismos de controle do sistema financeiro. Retoma a importância das carreiras nos serviços públicos em Saúde, educação, assistência social, ciência e tecnologia, energia, abastecimento e serviços de transportes e recoloca a necessidade da reforma tributária para corrigir as injustas estruturas de concentração de renda.

Aliás, para enfrentar o novo coronavírus, ainda faltam medidas importantes como a revogação da Emenda Constitucional 95, que congela os gastos sociais por 20 anos, a taxação emergencial das grandes fortunas, a suspensão de despejos e de reintegrações de posse, a liberação de presos sem condenação ou com penas menos gravosas para prisão domiciliar, a suspensão da cobrança de tarifas de água, luz e gás, a suspensão dos juros por atrasos de empréstimos e financiamentos, dentre outras medidas emergenciais.

Mas para isso, é preciso um governo com compromisso e empatia popular. E Bolsonaro não é este governo. É incapaz de liderar o Brasil na superação da pandemia e da crise econômica. Basta comparar suas propostas com as medidas dos líderes mundiais que aprofundam a restrição de isolamento e liberam vultosos recursos para os setores mais vulneráveis da economia. Por isso, é necessário que os poderes constituídos encontrem, com urgência, uma saída constitucional e democrática para retirar este desgoverno irresponsável do poder. É a medida sanitária que se impõe. Senão o caos será inevitável.

 

Mauri Cruz é advogado socioambiental, Diretor do Instituto IDhES, membro do Conselho Diretor do CAMP e da Diretoria Executiva da Abong e do Comitê Popular em Defesa do Povo e Contra o coronavírus.

Edição: Marcelo Ferreira