O ex-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder, detecta uma reação do jornalismo brasileiro em meio à crise. “Bolsonaro sabe disso e aposta na mentira sistemática como a fórmula de costurar seu mundo de fantasia”, questiona. “Ao atacar veículos e jornalistas (Bolsonaro) procura confundir a opinião pública”, acrescenta o presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), Luiz Adolfo de Souza, na avaliação de quem Bolsonaro se vale do cargo como meio de “mobilizar e fortalecer sua base de apoio”.
Para a presidenta do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (Sindjors), Vera Daisy Barcellos Costa, o atual hóspede do Palácio do Planalto acredita “que detém super poderes” e assim pode desrespeitar os veículos de comunicação e seus trabalhadores. Ressalta, porém, que o chefe do Executivo “ataca somente aquelas empresas que hoje já não o servem mais, como ocorreu no período que resultou na sua eleição”. Quanto aos ataques à imprensa, ela analisa que as corporações de mídia têm retrucado de forma tímida, cabendo a reação mais intensa aos sindicatos e à Fenaj.
“Como na guerra”
Presidindo uma das associações de jornalistas mais antigas do Brasil, fundada em 1935, e que teve Erico Verissimo como seu primeiro presidente, Souza receita “informação e opinião de qualidade” para “enfrentar calúnias e informações falsas”. Mas considera que “a reação da categoria não pode se igualar à baixeza dos ataques. Cabe aos jornalistas enfrentar ambientes hostis, como na guerra”.
Schröder lembra que Bolsonaro imita Donald Trump, o presidente estadunidense que nunca desfrutou do apoio da imprensa e passou a se comunicar com seus eleitores a partir das redes sociais. “Isto consolidou sua ruptura com a esfera pública nacional e ele constitui apoio quase que exclusivamente numa esfera privada ampliada e sem contato com a vontade nacional”, interpreta. O ex-presidente da Fenaj percebe as agressões de Bolsonaro como “uma espécie de teste de resistência no tecido social” que antecede “o golpe final para terminar com a imprensa”.
“Uma gripezinha”
O momento também é propício para a disseminação de notícias falsas. “É nefasto para o verdadeiro exercício do jornalismo”, avalia a presidenta do Sindjors. Repara que, comprometidas com o poder por diferentes motivos, as grandes empresas de comunicação navegam em águas turvas, “o que é muito ruim para a qualidade do jornalismo, atualmente assolado pelas fake news”.
“Em tempos difíceis o jornalismo sempre é vítima”, queixa-se Souza, recordando que, hoje, os profissionais “têm que responder até a robôs”. Para preservar a credibilidade sugere “um exercício de checagem constante, usando mais de uma fonte”. Vera Daisy destaca que, assim como a pandemia avança, a epidemia das fake news aumenta ainda mais. “A mentira criada e intensificada nas eleições de 2018 é um vírus letal para a saúde da população”, argumenta, lembrando o papel das notícias falsas na vitória de Bolsonaro. “Tanto que muitas pessoas, movidas pelas mensagens que recebem, repetem que a epidemia do Coronavírus é só uma ‘gripezinha’, como disse dias atrás o mandatário deste país”, cita.
Menosprezando os riscos
Na entrevista ao SBT, o presidente se dividiu entre os ataques aos governadores e à mídia. E, novamente, minimizou os riscos. No domingo, 22, data da entrevista, o Brasil tinha mais de 1,6 mil casos e 25 mortes. Na segunda, dia 23, os números eram outros: 1.891 contaminados e 34 óbitos. No mundo, no mesmo momento, havia 368 mil infectados e 16 mil mortes.
Edição: Katia Marko