A pandemia do coronavírus está intensificando ainda mais a crise financeira pela qual passam os mercados globalizados e, consequentemente, os trabalhadores e trabalhadoras ao redor do mundo. No Brasil, as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020 já vinham em queda e agora as perspectivas do mercado são de projeções negativas ou perto de zero.
Na vida real dos brasileiros, o contexto de baixo crescimento, aliado às restrições por conta do vírus, vão implicar em menor nível de atividade, com impactos negativos sobre o emprego e a renda, aponta o economista e professor da UFRGS Alessandro Donadio. “É uma crise severa. O país vai passar por um choque duplo: de oferta, via paralisia da produção, e de demanda, dada a quarentena e o fechamento de espaços públicos”.
Austeridade agrava situação
Donadio destaca que a política de austeridade do governo Bolsonaro compromete o investimento público e retarda ainda mais o processo de recuperação da atividade econômica do país. “É preciso medidas mais efetivas, como a revogação do teto de gastos e a revisão das metas de superávit primário, associadas a uma retomada do investimento público.”
O professor de economia da PUCRS Adalmir Marquetti concorda e vai além. Afirma que é fundamental assegurar aos estados e municípios os recursos financeiros ele, a conclusão é que esta crise poderá impactar diversas convicções a respeito da privatização do acesso à saúde em diversos países do mundo. Foto: Nelson Almeida / AFP Ambulantes e trabalhadores informais serão atingidos de forma cruel pela Pandemia para enfrentar as crises de saúde e econômica que se avizinham. Ele defende ainda a estatização de empresas com problemas financeiros para reduzir o impacto. E além de permitir o acesso às transferências sociais, sugere, “poderia se pensar em formas de redução da dívida das famílias, particularmente as de renda baixa”.
Os efeitos na economia gaúcha
O Rio Grande do Sul será afetado de maneira similar ao Brasil, enfrentando uma forte crise na saúde e na economia, avalia Marquetti. “Isso vai se associar com a queda da safra de verão decorrente da forte estiagem que atingiu muitas regiões do estado. Portanto, a economia gaúcha em 2020 terá uma situação extremamente delicada com a combinação desses dois choques.” Como a receita do governo do Estado deve cair muito, ele considera importante a atuação do governo federal para reduzir o impacto financeiro que a crise terá sobre as finanças estaduais.
Crise é maior para pequenos, autônomos e informais
Grandes empresas tendem a suportar melhor as flutuações de fluxo de caixa. Já as pequenas tendem a sofrer mais. Por isso, sugere o economista Alessandro Donadio, é importante adquirir bens e serviços de pequenos negócios locais. “Isso é sempre uma atitude correta, principalmente porque os pequenos negócios tendem a gastar a renda que gera na economia local, criando um ciclo virtuoso para a atividade econômica.”
Para quem trabalha como autônomo ou na informalidade, o impacto será ainda maior, aponta Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Numa situação de grande choque na economia, os profissionais com carteira assinada não têm variação significativa da renda. “Já para os conta própria, cuja renda depende diretamente da atividade que fazem, o choque pode ser muito maior e eles também não têm acesso a mecanismos compensatórios do governo, como INSS ou FGTS”, repara.
O limite do neoliberalismo
Para Marquetti, a pandemia pode ter consequências políticas importantes e diferentes das que ocorreram após a crise de 2008. “O neoliberalismo pode ser colocado em cheque por sua incapacidade de salvaguardar a vida das pessoas. Isso é especialmente verdadeiro quando comparado com a capacidade da China em enfrentar a crise na saúde pública e com a retomada do crescimento econômico.”
A situação mostra que somos uma sociedade e não apenas indivíduos, destaca Donadio. “A atual crise sanitária, assim como a crise ambiental tem trazido à tona a demanda por novas formas de arranjos econômicos baseados em cooperação. A questão reside em construir esses novos arranjos ao mesmo tempo em que se preservam conquistas como sistemas de saúde públicos”. Para ele, a conclusão é que esta crise poderá impactar diversas convicções a respeito da privatização do acesso à saúde em diversos países do mundo.
Edição: Katia Marko