Em sua ata de medicação da greve dos petroleiros, o Ministro do TST, Ives Granda, agradece a proteção de Deus. Sabendo que este Ministro é ligado ala conservadora da Igreja, um companheiro grevista questionou de que Deus ele estava se referindo: do Antigo ou do Novo Testamento? Considerando boa a pergunta, escrevi esta breve reflexão.
O Velho Testamento relata a origem dos hebreus desde o surgimento da humanidade a partir de figuras mitológicas. É a história de um povo nômade em busca da Terra Prometida que, lá pelas tantas, acaba escravizado no Egito. A libertação (coletiva) é conquistada ao cruzar o Nilo, cuja importância deu origem à Páscoa Judaica (nos anos 70, a Teologia da Libertação inspirou-se profundamente nesta passagem bíblica). Mas, para consolidar uma nação é preciso disciplina e leis rígidas (olho por olho e dente por dente) que servem para manter ordem interna. O fundamentalismo religioso se baseia enfaticamente neste período histórico.
Com o Império Romano, a situação, porém, é diferente, pois os romanos usam a estratégia de aliar-se aos líderes judeus o que dá origem às críticas dos profetas enquanto proclamavam a vinda de um “Salvador”.
O Novo Testamento, no entanto, relata a vida de Jesus que conhecia bem a história do seu povo e a situação política da época. Ele dedica suas críticas aos líderes religiosos que mantinham alianças com os romanos, propõem a superação das velhas leis (as bem aventuranças e amar ao próximo), propõem o perdão e a compaixão, e, acima de tudo, vive com o povo. Entre seus seguidores existem ricos e pobres, conservadores e revolucionários.
O discurso de Jesus focado nas virtudes pessoais driblou o poder até o dia em que os líderes religiosos se viram ameaçados e tramaram a sua morte, fazendo cumprir as profecias. A cruz que deveria servir de ameaça, tornou-se símbolo para seus seguidores. A “ressureição” deu origem a Páscoa dos cristãos para os quais a vida vence a morte. Eis aqui mais um elo com a Teologia da Libertação: todos temos direito à vida em plenitude, razão pela qual entrou em choque com os sistemas capitalistas e autoritários.
Hoje começa a Quaresma, tempo que os católicos dedicam à preparação para a Páscoa, para os quais é momento de refletir sobre o que nos impede de viver em plenitude (seja na vida pessoal, seja na sociedade) e em soluções para estes problemas. Nós, brasileiros, estamos passando por um período onde líderes religiosos se aliam a governantes para manter a dominação do grande império moderno (capitalismo globalizado). Seu líder usa o nome de Messias para iludir o povo enquanto age para vender nossas riquezas a troco de banana. A libertação deste sistema não pode depender de um novo líder, mas precisa ser cultivada em formas de resistências coletivas seja nas comunidades ou nos grupos organizados de trabalhadores rurais e urbanos. A greve dos petroleiros tornou-se histórica ao mobilizar mais de 21 mil trabalhadores em solidariedade aos 396 demitidos no Paraná. Ela marca a luta pela dignidade humana contra o desprezo daqueles que estão no poder e contra os trabalhadores, além de defender a soberania nacional ao lutar contra a privatização da Petrobrás. Este caminho construído coletivamente é longo e difícil, mas é o mais seguro para que a “libertação” seja conquistada em plenitude.
Assim estaremos superando o Deus do Antigo Testamento e seguindo Aquele que disse, “eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância”. (Jo 10,10). Não nos resta outro caminho, senão defender a Vida contra o projeto de morte anunciado por estes que se dizem de Deus!
*Diretor de Formação do Sindipetro-RS
Edição: Marcos Corbari