No atual contexto de xenofobia que se entranha pela sociedade brasileira, a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) oferece um contraponto com potencial de mitigar mais de um preconceito. O Prohaiti, Processo Seletivo Especial para Acesso à Educação Superior para Estudantes Haitianos, criou novas vagas para os refugiados do país caribenho em cinco dos seis campi UFFS. Ao favorecer a integração, a iniciativa obriga a pensar em migração e diversidade.
Expulsos de seu país por terremotos, crises políticas e uma realidade de extrema pobreza, os haitianos conquistaram facilidades para ingresso na vida acadêmica por um acordo firmado com a Embaixada do Haiti em 2013. Posto em prática no ano seguinte, na sede da universidade, em Chapecó (SC), o benefício estreou em Erechim, no norte gaúcho, em 2019. Um dos participantes do Conselho Universitário na época, o professor Paulo Ricardo Müller lembra que houve certa relutância entre os docentes, temerosos de que o nível dos cursos baixasse, uma vez que os testes de admissão limitam-se aos de língua portuguesa.
Também havia incerteza quanto à aceitação dos alunos locais, em geral originários de comunidades pequenas que, de repente, topavam com diferenças de língua, raça e costumes nas salas de aula. “A universidade espelha a sociedade”, diz Müller, que é doutor em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista em estudos africanos, migrações internacionais e refúgio. “É importante desenvolver mecanismos que colocam em pauta a diversidade, para não se deixar cair na ideia de uma sociedade hegemônica”.
Depois de cinco anos em Chapecó, o Prohaiti surge pela segunda vez em Erechim, cidade que até poucos anos atrás se orgulhava de ter recebido imigrantes europeus, de cor branca e das nacionalidades polonesa, alemã e italiana. Movimentos migratórios mundiais mudaram essa configuração. “Os vendedores ambulantes que se veem pelas ruas do centro são senegaleses”, exemplifica Müller. Imagina-se que convulsões sócio-políticas em outros países possam alterar ainda mais esse panorama.
Dos que vieram do Haiti, além dos nove já matriculados e dos que ingressarão neste ano, sabe-se que a maioria está empregada na indústria. O que poucos sabem o professor relembra: “Normalmente, o imigrante é visto como um pobre em busca de trabalho, mas há muitos haitianos que vieram para cá já formados professores e estão dando aula”. Com projetos como o Prohaiti, essas populações poderão contribuir ainda mais com a sociedade que as acolhe.
Edição: Marcelo Ferreira