Os cortes na Educação promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL) foram alvo de protesto de milhares de manifestantes que foram às ruas do país, nesta quinta-feira (3). No Rio Grande no Sul não foi diferente. As cidades que sediam os campus de universidades federais registraram manifestações. Neste ano, o Ministério da Educação anunciou dois cortes expressivos no orçamento. O primeiro de R$ 5,8 bilhões e o segundo de R$ 348 milhões.
A jornada de lutas dos estudantes e trabalhadores começou na última quarta-feira (2), com reuniões, encontros e aulas abertas em diversas universidades país afora para discutir a política do atual governo para o setor.
Milhares nas ruas da capital
Em Porto Alegre, durante os dois dias, a comunidade acadêmica realizou diversas atividades junto a população, prestando atendimento e dialogando sobre a importância da educação pública superior frente aos ataques do governo de Jair Bolsonaro. Na quinta-feira (3), às 17h, estudantes, professores e técnicos se reuniram no pátio da Faculdade de Educação (FACED), no campus central da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), para o ato que encerrou as 48 horas de suspensão das atividades acadêmicas.
Enquanto os estudantes aguardavam para dar início à caminhada até a Esquina Democrática, técnicos-administrativos da UFRGS, UFCSPA e IFRS decidiam em assembleia entrar em estado de greve contra os cortes nas universidades e Institutos Federais e contra o projeto Future-se. A caminhada iniciou pouco antes das 18h, com milhares de pessoas. Durante o trajeto, houve manifestação de apoio através de buzinaços, e a distribuição de panfletos pelos manifestantes. Da Esquina Democrática, os manifestantes seguiram pela avenida Júlio de Castilhos, passando pelo Túnel da Conceição, até se encerrar nas imediações do campus central da UFRGS.
Liberação de recursos insuficiente
No início da semana o ministro da Educação Abraham Weintraub anunciou o descontingenciamento de R$ 1,99 bilhão no orçamento do Ministério da Educação. Para a representante na UFRGS do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Elisabete Búrigo, a liberação é resultado da pressão da comunidade acadêmica. “O ministro tenta nos imobilizar com uma pequena parcela de recurso, tenta dar a ideia que está em boa relação com as universidades, mas os prejuízos já são irreparáveis. Prejuízos para pesquisa como perda de equipamentos, com fechamento do restaurante universitário do campus do Vale, porque não teve a manutenção adequada, redução da vigilância”, exemplificou.
A mobilização também é um alertar sobre o projeto Future-se, que na avaliação de Elisabete é uma tentativa de colocar o patrimônio construído ao longo dos anos a serviço da privatização. “Esse projeto segue a lógica de mercado através das tidas organizações sociais que regulariam o funcionamento das universidades. Além de colocar as universidades a serviço de interesses privatistas, ele tenta também tirar toda a autonomia das universidades”, afirmou.
Na avaliação do presidente do Sindicato Intermunicipal dos Professores de Instituições Federais de Ensino Superior do RS (Adufrgs), Lúcio Olímpio de Carvalho Vieira, a liberação nada mais é do que a devolução do que já era da educação. “O dinheiro não é do governo, ou do presidente da república, o dinheiro é do povo. Dinheiro que estava previsto na constituição, na lei orçamentária para 2019, portanto cabia a ele devolver, e ele não devolveu tudo ainda, está devendo, então temos que continuar cobrando que devolva ao povo o que é do povo”, destacou.
Seguindo a mesma linha, Sibila Binotto, coordenadora jurídica de relações de trabalho Assufrgs Sindicato, afirma que a greve dos últimos dias e o ato mostra a insatisfação do corpo acadêmico. “O governo deu um pequeno valor, e não é suficiente para cobrir todo o rombo que ele fez na educação até agora, e um dos rombos é esse projeto Future-se que retira qualquer possibilidade da educação evoluir. Esse povo está na rua contra o Bolsonaro e contra o Future-se e para que o governo traga de volta tudo que foi retirado da educação”, ressaltou.
Sibila explicou ainda que a categoria decidiu entrar em estado de greve para manter a mobilização da categoria e enfrentar os ataques do governo à carreira dos trabalhadores das IFEs e à educação pública. “Vamos construir a greve com o total da educação, com todas as outras categorias”, concluiu.
48 horas de paralisação ativa
Aprovada na última quinta-feira (26), em assembleia conjunta entre professores, técnicos e estudantes, as 48 de greve tiveram estudantes e professores nas ruas mostrando o que se faz nas universidades, como foi o caso do “UFRGS na Rua”, atividade que reuniu cerca de 300 estudantes, de diversos cursos, no centro de Porto Alegre. Lá, prestaram serviços e debateram com a população sobre o que é feito dentro das instituições federais e a importância de se manter a qualidade frente ao desmonte que em acontecendo atualmente.
Gerusa Pena, estudante de direito da UFRGS e presidenta da União Estadual dos Estudantes, disse que os dois dias de ações feitas pelas universidades e institutos federais no país todo tiveram como objetivo comover a sociedade e trazer as pessoas que ainda não defendem a educação para essa luta. “Levamos as nossas pesquisas, nossos projetos, trabalhos, para apresentar para comunidade e explicar que defender a universidade pública é defender o remédio, defender o SUS, é defender que consigamos garantir os direitos básicos de todo mundo, e isso passa pela universidade. Temos um governo hoje, que reduz a importância das universidades e institutos federais, e estamos fazendo essas mobilizações para reforçar a importância desse patrimônio nacional que elas representam”, finalizou.
Para o Presidente da Adufrgs, a manifestação dessa quinta-feira (03) foi mais um ato importante na luta de resistência, que tem que estar casada com uma luta de proposição. “Não podemos ficar apenas fazendo a resistência contra as agressões que estão acontecendo. É necessário que agrupem em torno dessa luta muito mais personalidades, políticos. Apesar do ato ter sido organizado e chamado pelos estudantes, em defesa da educação pública como um direito seu, ela também faz parte da grande luta nacional, que passa pela defesa da soberania, da Amazônia, da defesa dos direitos políticos, em defesa de tudo aquilo que o povo brasileiro vem construindo ao longo da história”.
Estudante de letras/inglês da UFRGS, Ketlin Brito de Melo disse que importância do ato é mostrar que os estudantes não aceitarão que a universidade seja sucateada. “Não vamos ficar assistindo à ciência sendo tratada como última opção, sendo que a sociedade precisa de médicos, remédios, de vários recursos que vêm da universidade, e o povo não sabe disso, muitas vezes porque o trabalhador não tem tempo de chegar a essa informação. Muitas universidades públicas oferecem serviços grátis para comunidade, e isso vai ser tirado da gente e, consequentemente, do povo”, pontuou.
Loiva de Oliveira, professora do curso de serviço social da UFRGS, apontou que esse é mais um evento realizado em defesa da educação pública, uma vez as universidades federais e institutos estão sofrendo um processo de corte e privatização por meio do programa Future-se. “Hoje as universidades passam por uma situação de corte estrutural no orçamento, o que já está impactando objetivamente nas condições de funcionamento, no serviço terceirizado, no investimento em bolsas de pesquisa e extensão, o que prejudica estruturalmente o objetivo da universidade que é a produção do conhecimento e o serviço junto à comunidade”, concluiu.
Atos nas federais do interior
Estudantes e servidores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) foram às ruas, também abaixo de chuva, para defender a educação pública e lutar contra o programa Future-se, na greve geral da educação. Após concentração na praça Saldanha Marinnho, foi feita uma caminhada pelas principais ruas da cidade, onde os manifestantes dialogara, com a população. Oficialmente, a universidade realizou paralisações pontuais em setores como biblioteca, restaurante e laboratórios.
Na quarta-feira (2), o Conselho Universitário (Consu) da UFSM manifestou-se de forma contrária ao Future-se, por meio de nota oficial, aprovada em reunião aberta do Conselho, que contou com a presença de 49 conselheiros, além do reitor, e mais de mil estudantes, docentes e técnico-administrativos em educação.
A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e o IFSul amanheceram, nessa quarta-feira (2), no primeiro dia de Greve Nacional da Educação de 48h, sem aulas. Diversas atividades como debates, atos culturais foram realizados no dois dias e uma manifestação percorreu as ruas da cidade, na tarde dessa quinta (3).
A vice-presidenta da ADUFPel-SSind, Angela Vitória, salienta a ampla adesão das unidades acadêmicas. “As três categorias da UFPel e do IFSul estão muito dispostas a dizer não ao Future-se, a dizer não aos cortes, e a defender a Universidade com todos os seus cursos, com os projetos de extensão que ela desenvolve em todas as diversas áreas. A gente sente que este é um momento de fortalecimento da luta em defesa da educação e da Universidade Federal de Pelotas”, afirma.
Professores e as professoras da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e do IFRS - Campus Rio Grande também à Greve Nacional da Educação. A tarde dessa quinta-feira (3), segundo e último dia da greve geral da educação teve como principal atividade um ato no Largo Dr.Pio. Participaram professores e professoras, técnicos e técnicas, estudantes e comunidade em geral.
O presidente da APROFURG, sindicato dos docente da instituição, Cristiano Engelke, apontou a necessidade defender a universidade pública. “Esses dois dias representam uma oportunidade para nos encontrarmos e defendermos as nossas lutas. A greve é uma escolha política e um posicionamento claro contra o atual governo que quer acabar com a universidade, com o dinheiro, com as bolsas, além de entregar toda a estrutura para a iniciativa privada e para o mercado”, comenta.
Estudantes, professores e técnicos-administrativos da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) se uniram à greve de 48 horas. Na quarta-feira, os servidores debateram o projeto Future-se e outros temas, na Biblioteca Pública Municipal de Bagé. A Seção Sindical dos Docentes da Unipampa (Sesunipampa) informa que é contra a agenda “ideológica conservadora de extrema-direita do Governo Bolsonaro”. Atividades pedagógicas e oficinas foram realizadas também nos campus em São Borja, São Gabriel e Jaguarão.
Na quinta, no campus Uruguaiana, cedo da manhã os estudantes já protestavam contra os cortes de recursos e também contra a má qualidade do transporte coletivo que serve ao à Unipama, no Terminal de Passageiros, no Centro de Uruguaiana. Uma manifestação pública foi realizada no final da tarde.
O Conselho Universitário da UFFS aprovou, na segunda-feira (30), o pedido de destituição do reitor Marcelo Recktenvald, nomeado por Bolsonaro contra a vontade de comunidade acadêmica. Em Assembleia Geral, os docentes definiram mobilizações pelo cumprimento da decisão e a efetivação da destituição de Marcelo, contra o Future-se e pela recomposição do orçamento das universidades de 2019. Cada campus organizou a programação para os dias 2 e 3, combinando atividades letivas com mobilização e participação nos atos públicos.
Edição: Marcelo Ferreira