O desrespeito ao voto, expresso na escolha do novo reitor, causou revolta e motivou a ocupação da reitoria durante três semanas na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), com sede em Chapecó (SC) e campi em Cerro Largo (RS), Erechim (RS), Laranjeiras do Sul (PR), Passo Fundo (RS) e Realeza (PR).
Professores, estudantes, técnico-administrativos e comunidade regional elegeram um reitor, Anderson Ribeiro, mas o presidente Jair Bolsonaro (PSL) nomeou o candidato derrotado Marcelo Recktenvald. No dia 30 de setembro, a universidade deu o troco: o Conselho Universitário da UFFS (Consuni) votou a destituição de Recktenvald que, agora, deve ser encaminhada ao Ministério da Educação (MEC).
Mas o conflito está longe do fim. A começar pelo fato de que parte minoritária do conselho e a reitoria contestam a decisão. Alegam que os 35 votos favoráveis à destituição não representariam os 2/3 dos 54 conselheiros. Porém, para o sindicato dos professores (Sinduffs) houve a aprovação, pois é preciso descontar dos 54 conselheiros os três que não têm direito de votar.
Durante o debate, a mesa se retirou, declarando que o pedido fora rejeitado. Mas 41 conselheiros, a maioria, permaneceram sentados. Colocado em votação, o entendimento de que o número de conselheiros com votos válidos era de 51 prevaleceu, sendo aprovado com 37 votos. Tudo indica, porém, que há uma batalha jurídica a caminho.
Algo que não desperta qualquer dúvida é a rejeição da comunidade universitária ao reitor de Bolsonaro. Na última semana de setembro, professores, alunos e funcionários se manifestaram em peso contra a nomeação. Votaram nos seis campi da UFFS, aprovando a remoção. Quase 95% dos eleitores (1.633 votos) disseram não a Recktenvald.
Se estivesse no lugar de Recktenvald, o reitor eleito recusaria o posto. “Eu não assumiria”, garante. “Não é concebível, do meu ponto de vista, buscar o exercício do cargo máximo por outro meio que não o da legitimação pela consulta à comunidade universitária”, argumenta. Cabendo ao reitor representar a instituição há outro entrave. “Como fazer isso se (Reckentvald) não representa efetivamente a maioria da comunidade universitária e tampouco as decisões dos órgãos representativos de deliberação?”, questiona.
“Amados nunca foram, temidos não serão”
E o que acontecerá caso Recktenvald permaneça? “A UFFS vai se tornar um campo de disputa permanente entre a tentativa de implementar projetos vinculados ao governo federal e a defesa de princípios como a autonomia universitária, gestão democrática e rigor científico”, prevê Alexandre Fassina, o representante do Sindtae, o sindicato dos técnicos-administrativos da universidade.
Coordenador da seção sindical dos docentes da UFFS, Vicente Ribeiro diz que “temos um reitor somente no papel, sem respaldo da comunidade acadêmica”. Acha que o reitor de Bolsonaro tentaria “implantar a agenda desse governo sem pensar duas vezes”. Opina que sua alternativa seria “apelar para o medo” das pessoas. Como resposta, repete o lema do Movimento Ocupa UFFS: “Amados nunca foram, temidos não serão”.
“Não houve ilegalidade”
Fundada em 2009, a UFFS tem sede em Chapecó/SC e campus no Rio Grande do Sul (Erechim, Passo Fundo e Cerro Largo) e Paraná (Laranjeiras do Sul e Realeza). Mantém 44 cursos de graduação, 15 de mestrado e dois doutorados. Possui cerca de oito mil alunos, 720 professores e 700 técnicos administrativos em educação.
Por email, o Brasil de Fato RS encaminhou três perguntas ao reitor nomeado. Indagou, por exemplo, se, devendo sua escolha não aos professores, alunos e funcionários da UFFS mas ao presidente, não seria mais um representante de Bolsonaro do que da universidade. Através de sua assessoria, Recktenvald limitou-se a responder que não houve ilegalidade no processo que culminou na sua nomeação.
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Edição: Marcelo Ferreira