Enquanto a maioria dos deputados aprovava a reforma da Previdência no primeiro turno da votação no Congresso, nessa quarta-feira (10) - depois do que a oposição chamou de “compra de votos”, em que o governo liberou R$ 2,5 bilhões em emendas parlamentares como “prêmio” a quem votasse pelo sim, trabalhadores e trabalhadoras se reuniam nas ruas de diversas capitais brasileiras para denunciar o desmonte da aposentadoria. Em Porto Alegre, as centrais sindicais se uniram novamente em uma vigília na frente do prédio do INSS, dialogando com a população que transitava pelo centro da cidade.
“Essa reforma da Previdência significa o fim da aposentadoria e a entrega da nossa Previdência Pública para os bancos”, aponta a dirigente da Intersindical, Neiva Lazzarotto, que explicou que os dirigentes de sindicatos, federações e movimentos sociais se empenhavam, na fria noite porto-alegrense, em distribuir panfletos para a população, denunciando quais deputados gaúchos votaram contra os trabalhadores. “É um momento muito grave, em que o governo Bolsonaro está comprando os deputados a preço de ouro”, sinaliza.
O dirigente estadual da CSP-Conlutas, Érico Correia, contou que a vigília em Porto Alegre somava-se à luta dos trabalhadores que pressionavam os deputados em Brasília, contra as forças que vêm articulando a reforma. “O governo aumentou a liberação de verbas para deputados, a mídia vem divulgando pesquisas de apoio da população”, acusa. Para ele, é impossível que “qualquer cidadão desse país que tenha os mínimos conhecimento sobre o conteúdo da reforma, que a apoie”.
Para o presidente da CUT-RS, Claudir Nespolo, a liberação das emendas é um crime, pois “usa o dinheiro público para tirar direitos do público, da população”. Ele também critica o discurso de que a reforma vai resolver os problemas do Brasil. “Ocorre que na reforma trabalhista eles falaram que iam resolver o problema do emprego. Com a saída da Dilma, ia resolver o problema do Brasil. E nada! Simplesmente os trabalhadores perdem direitos e o Brasil perde sua democracia. Agora tem essa mesma conversa de que a reforma da Previdência vai resolver os problemas, trazer investimento, o que é uma conversa fiada”, assinala.
Na conta dos mais pobres
“Já está comprovado, e o governo não consegue desmentir isso, que daquele valor que ele estima que vai economizar em 10 anos, R$ 1 trilhão, quase R$ 900 bilhões vão sair de quem ganha menos de dois salários mínimos”, acusa Correia. “É uma reforma que vai piorar a vida das pessoas, dificultar o acesso à aposentadoria, aumentar a idade mínima, diminuir as pensões, uma série de ataques”.
“A reforma ataca, em 90% de suas medidas, os mais pobres. Trabalhadores que ganham de R$ 2 mil para baixo são os mais atingidos”, concorda Vicente Paulo de Oliveira Selistre, da CTB Nacional. Para o dirigente, a proposta de Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes é rentista e destrói as conquistas dos trabalhadores. “A Previdência Pública e solidária do Brasil é uma construção de décadas e décadas de tantos que lutaram, que morreram inclusive, defendendo uma Previdência Pública, que foi consolidada na Constituição de 88 e que sofre, hoje, sua maior ameaça na história recente do país”.
Selistre também destaca que, em um país assolado há séculos por desemprego e informalidade, “será para muitos a condenação de nunca se aposentarem”, enquanto quem possui grandes fortunas, heranças e grandes salários continua com tabela do Imposto de Renda regressiva. “Quem paga é a classe média baixa, a classe média e o trabalhador”, reflete, recordando de outras medidas de ataque aos mais pobres do projeto, como a redução da faixa de trabalhadores que recebem o abono do PIS. “Quantos trabalhadores ganham uma média de R$ 1.500 por mês e estarão condenados à extinção do abono, que o operariado apelidou de 14º. De um lado eles poupam R$ 90 bilhões, enquanto de outro lado eles mantêm medidas que privilegiam e beneficiam a questão fiscal, renunciando grana em favor de ruralistas, de exportadores do agronegócio e de grandes empresas”.
Economia de municípios será atingida
Os idosos de baixa renda que dependem do Benefício de Prestação Continuada (BCP) também estão na mira da reforma. “O governo fixa o BCP em R$ 400 para quem tem 60 anos, evidentemente que com esse valor as pessoas não conseguem sobreviver. A redução das verbas assistenciais, que está acontecendo a partir dessa reforma, afeta evidentemente toda a sociedade”, aponta Correia, motivo pelo qual, segundo ele, muitos municípios são contra a reforma.
“Alguns municípios têm até 60% de sua renda decorrente das aposentadorias. São valores superiores, inclusive, ao Fundo de Participação dos Municípios”, afirma o dirigente da CSP-Conlutas. “Reduzindo a renda das famílias, vai reduzir o consumo e desacelerar a economia, exatamente o contrário do que diz o governo. Essa reforma é uma medida fiscal, e não econômica. Portanto, ela não vai gerar emprego, ela não vai gerar renda. Ela vai tirar dinheiro dos trabalhadores, reduzir as aposentadorias e manter as pessoas mais tempo no mercado de trabalho”.
No mesmo sentido, a avaliação de Nespolo é de que a reforma vai tirar dinheiro de circulação e aumentar o desemprego. “Esse país está caminhando rapidamente para ser um ‘fazendão’, e todo mundo sabe como funciona a saúde, o salário e a educação no ‘fazendão’, é coisa do século 19. É no que a elite brasileira quer transformar o país. Mas estamos aí resistindo e denunciando”, finaliza.
Próximos passos do projeto
Apesar dos protestos em Porto Alegre e outras capitais, a reforma da Previdência foi aprovada em primeiro turno na noite desta quarta-feira (10), na Câmara dos Deputados, sob protestos das siglas PT, PSOL, PCdoB, PSB, PDT e Rede, que orientaram seus membros a votarem contra a proposta. O placar terminou em 379 votos favoráveis e 131 contrários, com a participação de 510 dos 513 parlamentares da Casa.
Após cinco sessões plenárias, a PEC volta a ser votada em 2º turno na Câmara, previsto para a próxima semana. Em seguida, a Reforma segue para o Senado, onde deve ser apreciada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), posteriormente numa comissão especial para avaliar a PEC e, por último, no plenário da casa.
Nova mobilização em Porto Alegre
Na sexta-feira (12), trabalhadores e estudantes voltam a ocupar as ruas de Porto Alegre para protestar contra o desmonte da aposentadoria e também em defesa da educação. Às 17h está marcada uma caminhada da Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) até a Esquina Democrática, no centro da capital gaúcha. A mobilização soma forças ao ato nacional convocado pela União Nacional dos Estudantes (UNE), em Brasília (DF), que será realizado durante o congresso da entidade, que acontece entre os dias 10 e 14 de julho. Os estudantes e trabalhadores prometem repetir a força dos atos realizados em todo o Brasil nos dias 15M, 30M e 14J, contra as os ataques aos direitos orquestrados pelo governo de Jair Bolsonaro.
Edição: Marcelo Ferreira