Rio Grande do Sul

MEIO AMBIENTE

Livro: Cadré Dominguez recoloca os perigos de Garabi/Panambi em foco

Jornalista denuncia os riscos ambiental e humano provocados pela construção de duas grandes hidrelétrica no Rio Uruguai

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
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O silêncio dos afogados – O ethos jornalístico e a complexidade ambiental em Garabi-Panambi”, de autoria do jornalista Carlos André Echenique Dominguez (Cadré), é mais que um livro derivado de uma tese de doutorado. A publicação da Editora Imaginalis (vinculada à UFRGS) compõe o relato reflexivo de mais de uma década acompanhando o projeto de construção de um complexo hidrelétrico no Rio Uruguai. A tese da qual deriva o livro foi defendida em 2015 e no ano seguinte recebeu menção honrosa no Prêmio Adelmo Genro Filho de Pesquisa em Jornalismo, apontando para a possibilidade de construção de um discurso complexo sobre o meio ambiente através de um jornalismo que considere também os saberes locais e não científicos. A investigação elabora um retrato do universo simbólico que envolve jornalistas e ribeirinhos perante o conflito acerca da construção das hidrelétricas do complexo de Garabi-Panambi.

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A breve resenha de apresentação do livro, lançado no dia 12/06/19 durante a programação do 28º Encontro Anual da Compós, na PUC/RS, expressa que “a pesquisa se debruça sobre as vozes representadas e silenciadas pela cobertura do noticiário”, traçando “um caminho que interliga a falha metabólica da separação entre homem e natureza até a questão da crise ambiental do século XXI”. Coloca em reflexão como “a crise de valores do Jornalismo a partir da modernidade acompanha essa problematização, em cujo ethos estaria também presente a força das imagens naturais e dos saberes não científicos, a fim de produzirem sentidos múltiplos e complexos”.

Cadré conversou com a reportagem do Brasil de Fato/RS e destacou que a participação dos movimentos sociais é muito importante no difícil processo de resistência empreendido por aqueles e aquelas que fazem das barrancas do rio, na fronteira entre Brasil e Argentina, seu lugar de ser no mundo. “O MAB (movimento dos Atingidos e Atingidas por Barragens) é muito atuante, estão inseridos em todas as situações que envolvem construção de barragens, sempre atuaram forte na conscientização”, registra.

Um longo processo de resistência

Outro segmento destacado pelo jornalista são as associações de pescadores e grupos locais de moradores das comunidades que são diretamente atingidas por lagos e inundações. “Quem busca desmembrar são as construtoras privadas que fazem a negociação das indenizações”, afirma, explicando que essas negociações não são mais feitas através do Governo Federal e Eletrobrás, ficando tudo direto com as empresas. “Há sim uma mobilização social atuante. O que falta é informação e transparência”, denuncia.

No que se refere ao percurso histórico do projeto, ele tem sua gênese no final da Ditadura Militar, com a assinatura do tratado Brasil-Argentina em 1983, possibilitando a realização dos estudos hidrelétricos na região do Rio Uruguai. Durante os governos Lula e Kirshner novos protocolos foram assinados, colocando em movimento forças interessadas na construção do complexo, porém também trazendo a público as primeiras informações sobre o projeto, alertando para o nível de devastação ambiental e a tragédia social que provocaria. “Hoje no Brasil e Argentina os cenários políticos são péssimos -, afirma Cadré, ressaltando que em ambos os países “não há nenhuma política que priorize energias alternativas, mais baratas e eficientes”.

Dominguez no Salto do Yucumã / Foto: Clarissa Hermes 

Alerta permanente

Um dos danos ambientais significativos é a provável inundação de uma grande área pertencente ao Parque Estadual do Turvo, onde está situado o Salto do Yucumã, maior salto longitudinal do mundo, que conforme denunciam os ribeirinhos e movimentos sociais, ficaria submerso. O que esperar de Macri e Bolsonaro? Para Cadré está claro que o Meio Ambiente não é assunto prioritário para os governos atuais, por isso as mobilizações de resistência devem ser fortalecidas. Três impeditivos importantes para a continuação do projeto Garabi/Panambi hoje são a preocupação de Macri com sua reeleição na Argentina, a ausência de recursos disponíveis no lado Brasileiro para um investimento que deve chegar à casa dos 15 bilhões de Reais e, o mais importante até agora, uma decisão da Justiça Federal de 2015  que julgou que a área do Parque Estadual do Turvo não pode ser inundada.

Aprendizados

Carlos André Echenique Dominguez é jornalista e professor do Curso de Jornalismo da UFPel. Ativista fortemente vinculado aos temas sócio-ambientais, nunca deixou de lado o caráter militante do jornalismo que empreendeu nos inúmeros veículos de comunicação onde atuou e, depois, também no fazer pedagógico construído a muitas mãos junto de alunos que lhe tiveram/têm como mestre no ambiente acadêmico.

Se no campo profissional a publicação do livro resume os aprendizados e a forja de um novo profissional depois de mais de uma década envolvido com o tema, é impossível que o campo pessoal também não sofra uma transformação. “No campo humano foi fantástico, os moradores da região são pessoas muito felizes, as crianças nas escolas são as mais interessadas e conscientes da importância de manter a vida boa que levam junto à natureza e com altíssima qualidade de vida. Os adultos e idosos não querem sair de lá, mas sim manter o lugar tão bem quanto já está”, registra.

– É muito emocionante conversar com os moradores do entorno do parque e os ribeirinhos, eles vivem bem e sabem disso. Não querem ir pra cidade. Abominam a vida na cidade. E amam o lugar lindo e exuberante onde vivem – , complementa. No arremate da conversa fica claro que um trabalho como esse forja não apenas um novo profissional, mas um novo ser humano: “Dá vontade de ficar lá para sempre. Aprendi muito. Todos os dias. Eles sabem o que é importante”.

 

* Com informações do autor e da Editora Imaginalis.

 

Referências:

www.lume.ufrgs.br/handle/10183/131900

www.ufrgs.br/imaginalis/editora/silencioafogados/

www.eletrobras.com/pt/Paginas/UnE-Garabi-Panambi.aspx

Edição: Marcelo Ferreira