Existente há mais de 50 anos, a comunidade da Vila Nazaré, localizada na Zona Norte de Porto Alegre (RS), abriga cerca de 1.300 famílias. A área que ocupam está situada no trajeto de ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho, que desde janeiro de 2018 está oficialmente nas mãos da concessionária alemã Fraport. A empresa, que havia exigido a remoção de todas as famílias até o final do ano passado, de acordo com a recomendação do Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU), é responsável pela realocação dos moradores.
A recomendação, que em primeiro momento havia sido expedida em caráter reservado, com o objetivo de preservar as tratativas de mediação junto à empresa, em busca de uma solução habitacional adequada aos moradores da Vila Nazaré, foi tornada pública na tarde dessa quinta-feira (6), após a empresa não apresentar nenhuma solução habitacional adequada.
A empresa alemã foi notificada de sua responsabilidade e obrigação pelo reassentamento, inclusive com relação ao custo, estimado em estudo preliminar da União em aproximadamente R$ 140 milhões, para atender as famílias que residem na Vila Nazaré, abstendo-se de realizar qualquer remoção forçada ou contra a vontade dos moradores do local.
A empresa foi notificada ainda que uma eventual realocação voluntária de famílias da Vila Nazaré para empreendimentos custeados com recursos federais, a exemplo dos empreendimentos habitacionais Minha Casa Minha Vida “Irmãos Maristas” e “Senhor do Bonfim”, não a exime de sua obrigação e responsabilidade de arcar com o valor dessas habitações, tendo em conta ser exclusivamente da concessionária a integral responsabilidade acerca das desocupações. Inclusive de custeio, com total observância aos parâmetros constitucionais e legais relativos a reassentamentos e realocações.
Posicionamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
Há mais de dois anos acompanhando a luta dos moradores da Vila Nazaré, o MTST lançau uma nota exigindo que a Fraport assuma suas responsabilidades perante os moradores. O movimento afirma que o reassentamento da comunidade deve acontecer conforme as necessidades comunitárias e de acordo com as exigências da legislação brasileira e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, bem como recomendam MPF e DPU. Leia a íntegra da nota:
MPF e DPU afirmam responsabilidade da FRAPORT na realocação da Vila Nazaré, em Porto Alegre. O MTST exige que a FRAPORT cumpra a recomendação
Há mais de 2 anos o MTST acompanha e apoia a luta e a resistência das quase 2000 mil famílias da Vila Nazaré, comunidade na Zona Norte de Porto Alegre. Foram muitas as denúncias sobre as violações de direitos cometidas pela FRAPORT e pelo DEHMAB [Departamento Municipal de Habitação] divulgadas pela comunidade e pelo movimento. A partir destes esforços foi instalado inquérito civil pela Procuradoria Regional de Direitos do Cidadão. Em divulgação oficial nesta quinta-feira (06/06), o MPF [Ministério Público Federal] e a DPU [Defensoria Pública da União] comunicam a quebra do sigilo do Inquérito Civil, onde reconheceram a responsabilidade da FRAPORT, transnacional alemã, no reassentamento das famílias da Vila Nazaré em Porto Alegre.
As obras de ampliação da pista do Aeroporto Internacional Salgado Filho ameaçam a Vila Nazaré há muitos anos. Desde 2016 a FRAPORT é a operadora do aeroporto, quando venceu a licitação pública para explorar o seu uso por 25 anos. Uma das primeiras ações da corporação foi contratar a Itazi – uma empresa especializada em remoção, conhecida por trazer agilidade ao processo de extirpação de comunidades. Apesar disso, Stefan Schulte, diretor da FRAPORT, afirmou que não tem “nada a ver" com a realocação da comunidade, durante a reunião dos acionistas da transnacional na Alemanha.
Frente ao posicionamento da FRAPORT, o MPF e a DPU notificaram a empresa sobre sua “responsabilidade" e “obrigação" pelo reassentamento da Vila Nazaré, "inclusive com relação ao custo", estimado em aproximadamente R$ 140 milhões. A recomendação é que a empresa atenda o direito à moradia de todas as famílias que residem no local, sem recorrer a propostas de reassentamento que não estão de acordo com os direitos da comunidade.
Os dois loteamentos apresentados como alternativas de moradia pela prefeitura de Porto Alegre são considerados insuficientes: um deles, mais próximo da Nazaré, tem apenas 364 unidades; o outro, no extremo norte da cidade, para onde iria a maior parte das famílias, é afastado de serviços básicos de educação, saúde e transporte públicos. Além disso, a comunidade não deseja ser dividida - os laços sociais construídos ao longo de seis décadas de convívio devem ser respeitados. Para completar, comércios não estão sendo considerados no realojamento, o que significa, para muitas famílias, perder suas fontes de rendam, desrespeitando seus direitos econômicos.
A desinformação e o medo são alimentados pela FRAPORT e pela prefeitura de Porto Alegre como forma de agilizar a saída das famílias: muitas pessoas souberam que perderiam suas casas apenas por notícias na televisão e no rádio, comprovando que não participaram em nenhum momento da tomada de decisão sobre seus destinos; serviços de atendimento à população foram aos poucos desativados na comunidade - posto de saúde e escola infantil fechados, esgotos entupidos, ruas esburacadas. É importante ressaltar que existem terrenos ociosos – inclusive públicos – em área vizinha a Vila Nazaré que podem ser destinados para a moradia popular.
O MTST exige que a FRAPORT assuma suas responsabilidades perante a Vila Nazaré fazendo com que o reassentamento da comunidade se dê conforme as necessidades comunitárias e de acordo com as exigências da legislação brasileira e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, bem como recomendam MPF e DPU.
EXIGIMOS QUE O DIREITO À MORADIA DIGNA SEJA RESPEITADO!
* Com informações da Assessoria de Comunicação Social do Ministério Público Federal.
Edição: Marcelo Ferreira