Sujeitos LGBTs ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) da região Sul do Brasil participaram de 29 a 31 de maio de um espaço de formação política no Rio Grande do Sul. As atividades aconteceram em paralelo ao 1º Intercâmbio de Mulheres, realizado em preparação ao Encontro Nacional das Mulheres Sem Terra, no Assentamento Filhos de Sepé, em Viamão, na região Metropolitana de Porto Alegre.
Essa foi a 5ª turma do Curso de Formação Política para LGBTs Sem Terra, a qual reuniu em torno de 35 pessoas que vivem em acampamentos e assentamentos da Reforma Agrária no RS, Santa Catarina e Paraná. Conforme Alessandro Mariano, da coordenação do Coletivo LGBT, a iniciativa, que já foi realizada em outras regiões do país, propicia uma formação mais ampla, com reflexões acerca do Movimento e de temas como diversidade sexual e identidade de gênero. Um dos objetivos é a auto-organização dos LGBTs do MST, a fim de estruturar coletivos nos estados.
“O coletivo é um espaço em que as LGBTs se encontram, discutem questões próprias e também pensam como inserir esse debate dentro da organização. Trabalhamos para identificar as opressões e os limites que cada LGBT encontra no seu espaço, e pensamos estratégias conjuntas de como podemos relacionar a questão do respeito à diversidade sexual em todos os espaços do Movimento”, explica Mariano.
O Coletivo LGBT realiza algumas atividades conjuntas com o Setor de Gênero do MST, por compreender que estão na mesma trincheira de luta contra o patriarcado, o machismo, a LGBTfobia e o racismo. A perspectiva, segundo Mariano, é superar essas opressões em diversos espaços da sociedade, uma vez que assim como qualquer outro cidadão esses sujeitos merecem respeito.
“A maioria dos LGBTs que está no Movimento tem a dificuldade de aceitação na família, depois na comunidade. Muitos saem do campo e vão morar na cidade por não serem acolhidos na sua comunidade, porque são tidos como os seres estranhos naquele espaço, que não se encaixam no padrão do que é ser homem ou do que é ser mulher, ou das formas de viver a afetividade e a própria sexualidade”, acrescenta.
Nesse sentido, o curso também é uma ferramenta que ajuda a fortalecer os LGBTs para que se compreendam como sujeitos no MST, e também para ampliar essa discussão no Movimento. Conforme Mariano, as atividades com as mulheres Sem Terra têm sido fonte de aprendizado e contribuído na auto-organização do coletivo. Nas ações em conjunto, no primeiro dia do curso no RS, participaram de estudo sobre patriarcado, capitalismo e diversidade sexual. No segundo dia, os LGBTs debateram sobre orientação sexual, identidade de gênero e luta de classes.
Para Mariano, outro acúmulo importante dessas atividades formativas é o encontro de gerações, a inserção de jovens em espaços do MST e afirmação de suas identidades, a partir do debate de questões individuais e comuns à coletividade. “Todos apontam que o Movimento é o espaço que nos acolhe, apesar das contradições. No Movimento também encontramos essa possibilidade de se entender como ser humano, de ter espaço de participação e de sociabilidade. O curso tem apontado essa grande potencialidade que é a luta do Movimento, a organização coletiva”, complementa.
Desconstrução do machismo
Na sexta-feira (31), último dia de formação, foi feito um estudo sobre as linhas políticas e organicidade do MST. Na ocasião, Dê da Silva, também integrante do Coletivo LGBT, falou sobre a origem do Movimento e as suas formas de organização. Também destacou a importância do planejamento para conquistar mais lutadores da Reforma Agrária, bem como do avanço da formação política, ideológica e intelectual dos camponeses.
Dê Silva ainda acrescentou que é fundamental o processo de desconstrução do machismo e do patriarcado, para que o objetivo de transformação social do MST seja alcançado. “Não dá pra construirmos algo sem destruir algo que está podre e que nos impede de viver. Isso se dará no trabalho de base, de formiguinha, a gente se colocando à disposição”, apontou.
Desafios
De acordo com Mariano, um dos desafios dos três estados que participaram do curso é estruturar seus coletivos LGBTs, com pessoas responsáveis por coordená-los, que atuem em diversos espaços e levem esse debate a todas as instâncias do MST. Outro desafio é fortalecer a luta pelos direitos sociais e por Reforma Agrária, principalmente neste governo conservador de Bolsonaro, que elegeu mulheres, LGTBs e Sem Terra como inimigos.
Segundo Mariano, avançar na formação também é uma prioridade. “Necessitamos que as LGBTs sigam estudando, porque há a necessidade da juventude estudar, terminar o ensino médio e fazer cursos de graduação, mas também de fazer formação política para estar capacitada e contribuir para fortalecer a luta do Movimento”, conclui.
Curso para LGBTs
Segundo Silva, o Coletivo LGBT do MST nasceu a partir da demanda de incluir a discussão da diversidade no Movimento. No último Congresso Nacional dos Sem Terra, isso ganhou força com o debate sobre a efetivação da Reforma Agrária Popular. Em novembro de 2018 o Coletivo LGBT foi consolidado.
“Quando construímos uma Reforma Agrária vinda do povo, não podemos deixar de debater o povo que a constrói. Nós começamos a discutir a diversidade do MST, porque vimos que havia muitos sujeitos e que eles eram inviabilizados dentro da organização”, explica Silva.
A partir da constituição do coletivo nacional, foi concretizado o Curso de Formação Política de LGBTs Sem Terra. Sua primeira edição foi em junho de 2017, no Nordeste do país. A segunda foi no Sudeste, a terceira no Nordeste e a quarta no Sudeste. A sexta e a sétima edição serão realizadas nos meses de junho e julho, novamente no Nordeste.
Edição: Marcelo Ferreira